Novas metodologias e indicadores ajudam a identificar o que torna certas regiões mais adensadas do que outras – e apontam caminhos para a tomada de decisão de gestores públicos.

Densidade urbana

Como as novas metodologias e indicadores ajudam a identificar a densidade urbana e seu impacto nas cidades

Medir a densidade urbana, definida pela proporção da população de uma cidade pela área que ela ocupa, é um cálculo fácil. Mas há uma série de outros fatores e indicadores que podem explicar o que torna determinadas cidades mais adensadas do que outras. Em certos casos, a concentração urbana se deve à oferta de serviços e capacidade instalada de infraestrutura (vias públicas, transporte urbano etc), assim como uma baixa densidade pode ter relação com a falta de áreas para uso residencial.

A “anatomia da densidade” foi o tema que reuniu especialistas, professores e urbanistas de renome internacional em webinar promovido pelo Marron Institute of Urban Management, da New York University, no dia 18 de março. Estiveram presentes o professor Shlomo “Solly” Angel, especialista em Políticas de Desenvolvimento Urbano e líder do projeto NYU Urban Expansion; o urbanista e professor do Marron Institute Alain Bertraud; a diretora do World Resources Institute (WRI), Anjali Mahendra; e mediação de Eduardo Moreno, head de Inovação no UN-Habitat, Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos, com sede em Nairobi (Quênia).

O professor Shlomo “Solly” Angel desenvolveu uma metodologia que permite comparar características de ocupação nas cidades e entender porque elas são mais ou menos adensadas. E, além disso, aponta caminhos para que os gestores públicos tomem decisões para melhorar a qualidade de vida e a oferta de serviços nestas regiões. Para compreender de maneira mais ampla a densidade urbana de uma região e suas características, é preciso estudar dois fatores fundamentais, diz o professor: a ocupação do espaço (proporção entre o volume de pessoas e a área disponível para moradia) e a densidade desta ocupação, ou seja, a extensão da área residencial em uma cidade.

“Não existe um padrão quando se fala em densidade urbana, cada cidade tem uma combinação particular de fatores. Em Hong Kong, por exemplo, a densidade vem da altura dos edifícios; em Kinshasa (Congo), o fator principal é a aglomeração; já em Dhaka (Bangladesh) e Bogotá (Colômbia), da cobertura residencial. É preciso olhar cada um desses aspectos para entender as características de cada região”, afirmou o professor Angel no webinar. Para ele, entre as estratégias para adensamento urbano estão a ampliação da taxa de ocupação das unidades habitacionais, a melhoria da eficiência no uso do solo, a construção de prédios mais altos e o estímulo ao compartilhamento residencial.

HÁ UM MODELO IDEAL PARA O ADENSAMENTO URBANO?

“Não podemos pensar em densidade urbana como um indicador homogêneo. Aspectos culturais variam de cidade para cidade. Kinshasa (Congo) e Bogotá (Colômbia) têm a mesma densidade, mas condições completamente distintas”, ressaltou Anjali Mahendra, diretora de Pesquisas Globais do World Resources Institute (WRI).

Para ela, densidade deveria ser um indicador neutro, não necessariamente positivo ou negativo, pois não existe um padrão ideal. “Os planejadores e gestores públicos devem olhar para esses dados como uma ferramenta para futuras ações e objetivos. A grande questão é saber se é possível adensar áreas com bastante ocupação e também entender quais áreas estão superlotadas, ou seja, com poucos serviços para muitos moradores”, destacou.

No caso de Bogotá, citou Anjali, a urbanização com acesso a serviços e infraestrutura de transporte melhorou a qualidade de vida – e valorizou a área construtiva da cidade. “Ao adensar, é preciso manter os serviços acessíveis aos mais pobres – este é o desafio, embora muitas cidades não apliquem políticas nesse sentido”, alertou.

 

“CIDADES NÃO SÃO ESCULTURAS, MAS ESPAÇOS FÍSICOS”

“As cidades não podem ser construídas como uma escultura, elas são feitas de espaço físico”, alertou o urbanista Alain Bertraud, pesquisador sênior do NYU Stern Urbanization Project e que já desenvolveu projetos e consultorias em cidades como Bangkok, Paris, Nova Iorque, entre outras. E, acrescentou, é difícil estabelecer um padrão ideal, pois varia de acordo com a renda e, até mesmo, com a cultura de cada região. “Para uma família de classe média em Paris, viver em uma área de 6 metros quadrados por pessoa pode ser aceitável, mas não o é para uma família com a mesma renda que more no Texas, por exemplo”, comparou.

No webinar, ele questionou outro mito, o de que uma taxa de ocupação maior reflete na riqueza de uma região. “Não é possível encontrar essa relação. Você pode ter um PIB alto em Hong Kong, que é muito adensada, ou em Dallas, que é menos populosa. E se você for um jovem procurando emprego nos Estados Unidos, será mais fácil se manter em cidades menos densas e com alto valor de imóveis, como Atlanta, do que em San Francisco, por exemplo”, argumentou Bertraud.

Para ele, o caminho não deve ser reduzir o adensamento, mas investir em infraestrutura nestas regiões com maior ocupação.  “O trabalho de quem planeja uma cidade é o fornecimento contínuo de espaço. Quanto há de espaço possível para ser construído? Numa mesma cidade pode haver deslocamento de pessoas de uma região para outra – no fundo, é a população que decide onde quer se concentrar”, sintetizou.

Um paradigma comum, seja em países desenvolvidos ou em desenvolvimento, é “abrir espaço suficiente para a construção de unidades habitacionais acessíveis”, disse o professor Shlomo Angel. Para isso, segundo ele, é preciso conhecer os parâmetros de urbanização de cada região. “Isso é uma métrica-chave para os gestores; e, se pudermos medir também, poderemos fazer algo a respeito. Se somarmos a isso o uso de inteligência artificial, teremos padrões mensuráveis para qualquer cidade, a qualquer momento”, ressaltou.

Confira, a seguir, as ações recomendadas pelos especialistas aos gestores e planejadores urbanos em relação à densidade urbana:

  • Encorajar a vida em comunidade.
  • Incentivar o compartilhamento em família.
  • Encorajar o uso misto nas cidades.
  • Incentivar construções leves.
  • Expandir o zoneamento para residências multifamiliares.
  • Reduzir o tamanho mínimo do lote para casas únicas.
  • Reduzir os requisitos de estacionamento.
  • Reduzir as restrições de altura de construção.
  • Permitir a subdivisão de unidades habitacionais.
  • Permitir várias unidades em lotes unifamiliares.
  • Permitir a adição de pisos em unidades já construídas.
  • Aumentar as taxas de área permitidas.
  • Ampliar o acesso ao financiamento de construção.
  • Melhorar o projeto de prédios altos.
  • Permitir licença de casas vagas.
  • Reverter a tendência de abandono das áreas centrais da cidade.
  • Evitar o deslocamento de grande número de pessoas por meio da renovação urbana.
  • Evitar despejos em massa.
  • Evitar a superalocação de terras para uso industrial.
  • Acelerar a conversão de áreas industriais em terrenos para uso residencial.

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