a melhor cidade

O fundador do Novo Urbanismo conta um pouco da sua trajetória e da visão sobre “a melhor cidade”.

A relação existente entre o espaço público – as ruas, as praças e os parques – e o domínio privado – os lotes, as casas – é o que definirá se uma cidade é boa para viver. Essa é a “receita” do arquiteto norte-americano Andrés Duany, reconhecido planejador urbano que vem guiando urbanistas do mundo todo no planejamento das cidades sob as diretrizes do Novo Urbanismo desde os anos 1980. Ao lado da arquiteta Elizabeth Plater-Zyberk, ele fundou a DPZ, em Miami (EUA), há 40 anos, escritório que se tornou referência internacional em desenvolvimento urbano planejado e sustentável, e, também, o Congresso do Novo Urbanismo, em 1993, movimento que se tornou um marco na disseminação dos conceitos para promoção de crescimento urbano sustentável a partir da criação de comunidades compactas que priorizam os pedestres.

“A maior parte do subúrbio americano é muito boa no privado e a maioria das cidades europeias são excelentes no público, mas quando você vai para os apartamentos, não é tão legal. Então, para mim, a ideia é o equilíbrio”, argumenta Duany. Ele cita a capital francesa como exemplo. “Paris tem um domínio público excepcional, as avenidas são ótimas, os parques são ótimos e o passeio pelo rio é ótimo, mas a maioria dos apartamentos são pequenos e escuros. E essa é uma razão pelas quais os parisienses estão sempre nos cafés. É uma cidade adorável na esfera pública, mas fria e escura no espaço privado”, considera.

O oposto acontece na cidade de Dallas, na região norte do Texas (EUA), na avaliação de Duany. “Não há nada além de estacionamentos e engarrafamentos, mas quando você entra em uma McMansion, é um paraíso: tem grandes espaços, grandes sofás, academia, ar condicionado e muitos banheiros. É um exemplo do espaço privado sendo espetacular, mas com domínio público terrível”, opina, utilizando o neologismo (McMansion) criado para referenciar as “mansões” de características similares reproduzidas em escala, como um produto de uma rede de fast food. De acordo com uma pesquisa realizada pelo site imobiliário Realtor.com, as McMansions representavam 40% das residências de Dallas em 2018.

Nesse sentido, tendo o equilíbrio entre o público e o privado como referência, Andrés Duany revela que Charleston, na Carolina do Sul, é a sua cidade favorita nos Estados Unidos. “Charleston tem um equilíbrio quase perfeito entre ruas agradáveis e arborizadas e casas excepcionalmente agradáveis. Por isso eu digo que Charleston é minha cidade americana favorita porque é a melhor cidade em equilíbrio entre o domínio privado e o espaço público”, reforça. A revelação foi feita por ele nos episódios de Questions & Answers (Q&A) publicados no canal da DPZ CoDesign no Youtube.

“Planejadores urbanos devem ir para lugares que não iriam”         

Quando Andrés Duany e Elizabeth Plater-Zyberk fundaram a DPZ, em 1980, eles tinham em torno de 30 anos de idade e haviam escolhido a cidade de Miami para se estabelecerem seis anos antes. “Miami não era um lugar que teríamos escolhido. Eu teria preferido Boston. Nova York ou São Francisco, mas não havia trabalho. Era uma recessão em 1974”, afirma. Natural de Nova York, ele conta que decidiram pela cidade porque a cidade precisava deles. “Miami realmente tinha a necessidade de planejadores com novas ideias. Então, eu diria, como um conselho para um jovem planejador, ir para um lugar que essencialmente não iria por não ser legal o suficiente”, sugere. Para ele, os jovens planejadores urbanos devem procurar lugares que ainda não estejam “maduros”, pois costumam proporcionar mais oportunidades de trabalho; é encontrar a “próxima cidade” a ser desenvolvida.

Cincinnati e Cleveland, em Ohio, são cidades dos Estados Unidos que ele cita como exemplos. “Elas têm um tecido urbano maravilhoso e tiveram muito desinvestimento, mas, agora, com a mudança climática e o aquecimento global, aquele escalão de cidades ‘lá em cima’, no ‘refrigerador’, são áreas que vão voltar novamente e elas precisam de você”, diz, dirigindo-se aos jovens planejadores urbanos. E defende sua tese de que as oportunidades estão em cidades pequenas que possuam boa estrutura em uma área que não será tão afetada pelas mudanças climáticas.

Na construção da cidade ideal, Andrés Duany prioriza questões como comunidade diversificada e caminhabilidade. “A proposta é universal, mas a mensagem deve ser estruturada de forma diferente”, ressalta, referindo-se à argumentação a ser utilizada conforme o perfil do governo da região. Segundo ele, pode-se enfatizar que permitir a construção de cidades que podem ser percorridas a pé na mesma medida que é permita a expansão dos subúrbios nivela o campo de atuação e deixa o mercado decidir. Outra argumentação é a de que a caminhabilidade e a diversidade levam à igualdade social e levam à redução das emissões do cano de escapamento, afetando menos as mudanças climáticas. “Estamos propondo a mesma cidade, o mesmo urbanismo, as mesmas ideias, mas apresentadas de maneiras diferentes”, alega. Ele acrescenta a importância de saber como apresentar a ideia para não ficar “tropeçando politicamente”. “Espero que esta era da política como um campo de batalha simplesmente vá embora. Espero que isso torne a vida muito mais fácil”, acentua.

Um dos pontos que ele destaca é o significado de equidade social para o urbanismo – tema recente em seus debates. “Um grande empresário sabe como obter empréstimos, sabe como obter o zoneamento, mas um pequeno empresário ou um imigrante não sabe como fazer isso e isso é um problema substancial de equidade”, pontua. Andrés Duany admite que, apesar de simples, esse pensamento específico não havia lhe ocorrido até pouco tempo atrás. “Eu aprendi, ao longo dos anos, a permanecer aberto e a, realmente, trazer uma nova ideia à vida. Uma nova ideia quando aparece pela primeira vez é frágil e se você não der vida a ela, se encontrar uma nova ideia com o silêncio, ela morrerá”, alerta. E revela que aplica essa técnica de apoio a qualquer nova ideia que surja, até mesmo para aquelas que “fazem os dentes doerem”. “Se ela sobreviver a uma ideia a qual você teria discordado, se ela sobreviver quando você a trouxer à vida, você terá um grande momento, e eles são muito preciosos”, salienta.

Andrés Duany reforça o seu incentivo para que os jovens arquitetos tornem-se planejadores urbanos. “Você pode ter um efeito tremendo em tornar a vida melhor para os seres humanos”, frisa. Para ele, um dos aspectos interessantes é que se trata de uma profissão que não especializa, ou seja, para o planejador urbano tudo é relevante. “Não há quase nada no jornal da manhã, quando você o lê, que não seja, em alguma medida, relevante para o planejamento urbano porque é onde a atividade humana ocorre. Então, de repente coisas que você normalmente não estaria interessado tornam-se interessantes porque são profissionalmente relevantes”, argumenta. Ele conta que esse é o sentimento que costuma ter como planejador urbano. “É uma ótima profissão”, ressalta.

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