Executivos do setor de bairros planejados compartilham as suas iniciativas de transformação digital e os benefícios para o mercado
Com as restrições impostas pela pandemia do novo coronavírus, os desenvolvedores imobiliários precisaram identificar estratégias e ferramentas tecnológicas para continuarem comercializando seus empreendimentos de forma remota. A facilidade e a agilidade que os meios digitais proporcionam para o dia a dia das pessoas fazem como que essa seja tendência que veio para ficar no pós-pandemia. Ela traz oportunidades, mas também desafios que precisam enfrentados pelo setor e, em especial para o de comunidades planejadas, que precisará encontrar formas de aliar as experiências virtuais com as presenciais.
Essa foi a visão defendida pelo CEO da CIA Inteligência Imobiliária, Paulo Toledo, durante bate-papo promovido pela Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (Adit Brasil), na rede social Clubhouse, no dia 29 de abril. Mediada pelo presidente de honra da Adit Brasil e coordenador do movimento Somos Cidade, Felipe Cavalcante, a conversa contou também com a participação de Richard Schwambach, sócio-diretor da Wert Incorporações e Urbanismo, e de Leandro Daher da Costa, sócio-diretor da Tropical Urbanismo e Incorporação. No bate-papo foram abordados temas como o cenário dos bairros planejados no país, modelos de ancoragem, segurança em empreendimentos abertos e a importância de idealizar produtos para as pessoas.
Sobre os desafios das vendas de comunidades planejadas, Richard revelou que, para o lançamento do Prado, implantado na cidade de Gravataí (RS), foi realizado um intenso trabalho digital, com a criação de um aplicativo com diversos dados sobre o complexo, inclusive com filtros que ajudavam o público a escolher seu lote, além da disponibilização de óculos 3D para que os interessados pudessem vivenciar alguns ambientes. Paulo comentou que sua empresa está na terceira versão de uma plataforma para lançamento de empreendimentos, que fará a sua primeira ação 100% virtual, com pagamento por meio do PIX, em maio deste ano. “Estamos ansiosos e tomando os cuidados possíveis para não termos falhas. Todo mundo está buscando um caminho nesse panorama, onde a gente não consegue mais juntar 300, 500 pessoas no mesmo lugar. Por isso, pegamos a nossa operação e colocamos em uma ferramenta tecnológica, que agora está atingindo a sua maturidade”, afirmou.
O aplicativo Catarina, em fase de desenvolvimento, foi uma das soluções encontradas pela Tropical Urbanismo para auxiliar na rotina de seus clientes. “Estamos credenciando fornecedores e ajudando a precificar os serviços para dar um bom retorno para todos e compartilhar informações”, detalhou Leandro. Além disso, com o Escarpas Eco Parque, complexo de lazer com clube, marina e eco aventura – que teve um crescimento de procura com a Covid-19 –, eles conseguiram uma conversão de leads (contato de um interessado em potencial) pelo meio digital surpreendente.
Treinamento de equipes de vendas e ancoragem trazem resultados positivos para os projetos
Diferenciar os bairros planejados dos loteamentos é outra dificuldade enfrentada pelos desenvolvedores da área. Paulo observou, no bate-papo, que uma comunidade planejada é aquela na qual as pessoas podem morar, trabalhar, estudar e ter lazer no mesmo local. Contudo, muitas vezes, no processo de marketing e de comercialização, os corretores, ao invés de focarem na venda de um novo destino e nas mudanças que isso trará para os futuros residentes, acabam tratando o produto como se fosse um apartamento ou lote. Treinar as equipes, na opinião do CEO da CIA Inteligência Imobiliária, é algo complexo e que demanda capacitação permanente. Para ele, a melhor estratégia nesse sentido é levar os corretores para experimentarem o empreendimento e conhecerem outras iniciativas.
Paulo lembrou, ainda, que esse tipo de complexo passa também pelo dilema de precisar convencer o público a ir para um endereço que ainda não conta com serviços e conveniências. “E, assim, se entra em um ciclo em que não há moradores porque não tem uma escola e não existe uma escola porque faltam alunos. Tem que colocar a mão no bolso e criar uma atração para a região. No Cidade Pedra Branca, em Palhoça (SC), por exemplo, antes da pandemia, em 2020, foram efetuados quase 200 eventos, como passeios de bicicleta e atividades corporativas, para levar gente para o destino e proporcionar experiências”, ponderou.
No Parque Una, em Pelotas (RS), de acordo com Felipe, a proposta dos idealizadores foi a de iniciar com negócios pequenos, como food trucks, para conquistar as pessoas que vivem no entorno e que ali vão ter o seu “ganha-pão”. “Hoje, um investidor coloca R$ 50 mil em um contêiner e o aluga a valores atrativos, com uma boa rentabilidade e, assim, os desenvolvedores conseguem oferecer vida e serviços na localidade”, descreveu. Segundo Leandro, o segredo das comunidades planejadas, que para ele são o futuro no Brasil, é “fazer miniaturas”, ir entregando as conveniências e ambientações necessárias aos poucos para que o projeto cresça organicamente. “Tem que dar continuidade ao produto para que ele não perca força e engaje o público”, frisou.
Com o Órion Business & Health Complex, em Goiânia (GO), a empresa descobriu uma “dor” da classe médica e concebeu um empreendimento único na cidade com hotel, mall, clínica, espaço de convenção e hospital do Albert Einstein (SP) – que é a grande âncora do complexo. “Criamos um valor percebido maior que o de tabela e, com isso, uma expressiva quantidade de reservas. Nossa tática foi a de não liberarmos as vendas até o dia do lançamento, quando comercializamos cerca de 85% do Órion, somando R$ 220 milhões em um final de semana. Foi um momento único”, comemorou Leandro. De acordo com ele, há casos em que é preciso “estender o tapete vermelho” para se diferenciar e agregar valor ao bairro.
Já com o Prado, Richard assinala que possuir um parceiro como o colégio Sinodal foi essencial para o negócio acontecer. “Dentro da negociação, fizemos uma doação da área em troca da construção da escola com o tamanho, a qualidade e o tipo de arquitetura que conversasse com o nosso projeto e dentro de um prazo pré-determinado”, revelou. O sócio-diretor da Wert Incorporações e Urbanismo destaca que eles têm também um formato que prevê a edificação de uma estrutura para que um supermercado entre com um contrato de locação firmado em cima de um percentual do faturamento. Conforme Richard, é importante ter pessoas e instituições desde o início, como o Sinodal, para ajudar a remar na mesma direção e desenvolver o produto.
O empresário destacou que, depois das etapas de legislação e de licenciamentos, o lançamento dos empreendimentos é um dos principais desafios, que envolve não só as vendas, mas questões políticas, econômicas e sociais do país. Ele avalia que conceituar o Prado como um bairro-cidade para se destacar e confiar naquilo que foi idealizado auxiliou-os a passarem pelas crises e a terem resultados positivos, assim como a terem a capacidade de ajustar e de qualificar o complexo ao longo do tempo. “Desde o começo, mostramos que o projeto oferecia muito mais que a maioria dos produtos que se apresentavam como bairro planejado. Isso funcionou e as pessoas entenderam a dimensão que o Prado teria no futuro, daqui a 20 anos, que é um lugar que será maior que aproximadamente 60% das cidades do Rio Grande do Sul em termos de população”, comparou.
Desenvolvedores precisam de resiliência, paciência e capital para atuar com comunidades planejadas
“É um negócio de gente grande”, sentenciou Paulo Toledo, CEO da CIA Inteligência Imobiliária. De acordo com ele, o conselho para quem quer ingressar no mercado de bairros planejados é ter experiência, paciência e saber aonde quer chegar. Leandro Daher da Costa, sócio-diretor da Tropical Urbanismo e Incorporação, concordou que resiliência é uma das principais características que os desenvolvedores do segmento necessitam, pois são empreendimentos que têm um tempo longo de maturidade. “Estudar até a exaustão o produto, pois ele é muito diferente de outros projetos imobiliários, com uma grande exposição de capital e que precisa ter uma estratégia de conceituação e aprovação para não descobrir os problemas com o andar da carruagem”, acrescentou Richard Schwambach, sócio-diretor da Wert Incorporações e Urbanismo.
Na sala de bate-papo do Clubhouse, os participantes discutiram também o desejo dos empreendedores de aplicarem conceitos do novo urbanismo em suas iniciativas, com bairros abertos e fachadas vivas, ao mesmo tempo em que precisam atender à demanda das pessoas por mais segurança e locais fechados. Paulo conta que o Cidade Pedra Branca (SC) foi lançado com cerca de 2,5 mil lotes abertos e, mais recentemente, como consequência do aumento da violência, foi criado um condomínio fechado para responder aos anseios do público. “Já no VivaPark, em Porto Belo (SC), fizemos algo inédito no Brasil que foi o fechamento eletrônico do lugar. Os clientes estão em uma comunidade planejada aberta, mas que é toda monitorada e conta com sistema de pistão nas entradas que é acionado automaticamente e impede a circulação de veículos”, detalhou. Na loja-conceito do complexo, as pessoas puderam experimentar o mecanismo e ter a sensação de segurança desejada.
Já no Rio Grande do Sul, Richard frisa que não há, no momento, um contexto social que permita vender um loteamento de alto padrão aberto. “Não é economicamente viável. O que fizemos foi ajustar o projeto e criar bairros privados dentro do empreendimento maior. Da forma que ele foi desenhado, urbanisticamente, esses setores têm acesso à centralidade, que é onde tudo acontece”, garantiu. Leandro compartilhou que no Coralina, produto que estão desenvolvendo, a segurança é algo muito importante para os clientes e eles usaram o design thinking para entender o que eles queriam nesse sentido. “Por mim, haveria um movimento para acabar com os muros nos complexos. Tentei isso no Coralina, mas não conseguimos elaborar elementos que dessem a sensação de segurança”, relata. Por outro lado, o pai de Leandro, Paulo Roberto da Costa, fundador e diretor da Tropical Urbanismo, que acompanhava a conversa, defendeu que condomínios monitorados são ideais para o público de baixa renda e um filão a ser explorado.
Um debate muito presente da Adit Brasil, segundo Felipe Cavalcante, é como conciliar as necessidades do mercado imobiliário com a adoção de um urbanismo que evite o fechamento dos bairros planejados. “E a solução mais usada tem sido a de esconder o muro e ter no seu lugar casas ou comércios voltados para a rua. O cercamento traz mais insegurança do que as pessoas acham. Com uma fachada ativa, com mais gente na rua, a segurança é muito maior do que caminhar por uma via em que há muro dos dois lados”, enfatizou.
Convívio das pessoas deve ser planejado desde o início
Transformar o cliente no maior fã e defensor de um bairro planejado é o resultado de um intenso trabalho, que começa na concepção dos empreendimentos. Para Paulo Toledo, as pessoas são o diferencial nesse tipo de complexo. “Não podemos esquecer que estamos mudando a vida de quem decidiu ir para a nossa comunidade, temos muita responsabilidade e precisamos engajar esse público desde a sua chegada”, analisou. Richard tem a mesma visão e ponderou que a finalidade desses projetos é mudar a vida das pessoas. “Quem trabalha com isso acaba virando um apaixonado por esses produtos e disposto a aprender com os outros e ensinar”, disse.
Leandro complementou que estabelecer parcerias é uma arte e que é preciso valorizar e agregar aqueles que podem contribuir para a realização das iniciativas. “Temos que nos aproximar de quem faz melhor que a gente. Não somos super-heróis e não temos como fazer tudo sozinhos. Contar com parceiros auxilia ainda a dividir os investimentos e os riscos para concretizar grandes feitos”, assegurou. Ele apontou, também, que durante o trabalho de design thinking efetuado no Coralina a equipe chegou à conclusão de que é necessário oferecer uma experiência de hospitalidade (como a disponibilizada para clientes em hotéis) para as pessoas que moram nos condomínios da empresa. Essa é, de acordo com Leandro, uma maneira de colocar em prática os conceitos que inspiram a criação desses empreendimentos.
O Residencial Eldorado, complexo da Tropical Urbanismo em Goiânia (GO), lançado em 1989 e com mais de 5,2 mil apartamentos entregues, foi idealizado com shopping de vizinhança e praças, lembrou Paulo Roberto. “E, desde o princípio, tivemos associação de moradores, que é bem atuante na busca por melhorias junto à prefeitura. Acho que isso faz uma diferença enorme para o sucesso daquela comunidade e para que o bairro planejado não envelheça”, enfatizou.
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