Uma das principais batalhas urbanas da atualidade se dá entre os YImbys, aqueles que defendem uma maior produção de moradias nas áreas desejadas e dotadas de infraestrutura, e o Nimbys, as pessoas que combatem a produção de moradia em sua vizinhança
Avisão de como uma boa cidade deve ser é, de maneira geral, o principal ponto de divergência entre aqueles que integram os movimentos “Não No Meu Quintal” (Nimby, em inglês) e “Sim No Meu Quintal” (Yimby), na opinião do colunista de economia da Bloomberg e blogueiro Noah Smith. Em recente artigo publicado em seu site, ele traça um paralelo entre as crenças defendidas por cada um dos grupos a partir da realidade dos Estados Unidos e contrapõe seus conceitos sobre os efeitos da lei de oferta e procura nos valores dos aluguéis e como reduzir o preço das locações de moradias e o déficit habitacional. Smith detalha também a sua “Teoria do Aquário Yuppie” (Yuppie Fishtank Theory), uma alternativa para solucionar essas questões e a gentrificação.
O economista relata que os diversos Nimbys existentes citam, como argumento para se oporem à construção de novos empreendimentos residenciais a preços de mercado, a confiança de que esses projetos levam ao aumento do valor dos aluguéis e ao deslocamento das pessoas de seus bairros e de que não há preocupação dos incorporadores privados com a edificação de unidades populares. Além disso, seus membros consideram as alterações de restrições de zoneamento e de licenciamentos como mecanismos que beneficiam somente os empresários, aponta Smith. Os Nimbys acrescentam à lista de razões o fato de que a “desacreditada” lei de oferta e procura é utilizada pelos desenvolvedores para “induzir o público a pensar que liberar a edificação de residências a preços de mercado diminui os aluguéis”, segundo o autor do texto. O último item destacado por ele é que esses grupos indicam o controle do valor das locações pelos governos ou a oferta e a operação de moradias populares pelas gestões públicas como as únicas formas de reduzir o preço dos aluguéis.
Já em relação ao Yimbys, Smith observa que seus integrantes “tendem a abraçar teorias econômicas associadas a pensadores do livre mercado e que, geralmente, enxergam o problema da habitação a valores acessíveis como uma dificuldade de abastecimento”. Nesse sentido, esse grupo defende que as restrições de zoneamento devem ser revistas para possibilitar a construção de mais imóveis e amenizar o cenário atual de escassez de residências e de altos preços de aluguéis, descreve o economista. Apesar de serem favoráveis ao desenvolvimento de novos empreendimentos e da oportunidade de construir em áreas de baixo adensamento, os Yimbys não imaginam que simplesmente “permitir mais moradias a preços de mercado resolverá a crise habitacional ou criará cidades mais acessíveis – eles veem isso como uma peça do quebra-cabeça, junto com casas populares, medidas antidespejo, entre outras”, salienta Smith.
Para o autor, de forma resumida, os Nimbys parecem ver as localidades com um olhar “profundamente ligado ao passado”, com a ideia de preservar a cultura dos bairros a qualquer custo, enquanto os Yimbys querem construir uma cidade do futuro. Smith avalia, também, que não importa o quanto se tente “restringir os desenvolvedores, empresas e os recém-chegados”, as regiões irão se modificar e isso é inevitável. “E cabe a nós moldar essa transformação em algo equitativo e inclusivo, em vez de algo caótico e cruel”, ressalta. E, nesse panorama, o economista aponta que os Yimbys reconhecem que as forças que afetam os municípios mudam – pessoas e companhias entram e saem, imigrantes chegam–, e que o planejamento urbano precisa acompanhar essa alteração.
Estudos mostram queda das taxas de aluguéis e das habitações com moradias a preços de mercado
A relação entre a redução dos valores das locações e a construção de empreendimentos a preços de mercado é atestada por dados de pesquisas apresentados por Smith ao longo do artigo, que aponta ainda que essa é uma tendência que se confirma na grande maioria das situações. O levantamento feito por Xiaodi Li e publicado em 2016 apresenta informações que reforçam essa dinâmica. Segundo ela, para cada elevação de “10% no estoque de moradias, os aluguéis em um raio de cerca de 150 metros de novos edifícios diminuem 1%, assim como os preços de vendas de propriedades próximas também reduzem”.
Outro estudo abordado pelo economista em seu texto é o de Kate Pennington, divulgado este ano e que analisa o que acontece com os valores das locações em São Francisco (EUA) após um prédio pegar fogo e ser substituído por outro com preços de mercado. O resultado obtido por ela foi a constatação de que os aluguéis “caem em 2% para unidades localizadas até 100 metros de uma construção nova. Já o risco dos locatários serem deslocados para um bairro de baixa renda tem uma queda de 17%”.
Smith também agrega ao seu artigo o trabalho realizado em 2019 por Brian Asquith, Evan Mast e Davin Reed, do Upjohn Institute, sobre o impacto da edificação de habitações a preços de mercado nas locações e nos fluxos populacionais. De acordo com eles, os prédios novos diminuem entre 5% e 7% o valor das locações do seu entorno em relação a locais um pouco mais distantes ou que sejam desenvolvidos depois. Os pesquisadores identificaram ainda que esse cenário aumenta a migração interna de áreas de baixa renda. “Os resultados são impulsionados por um grande efeito de oferta – mostramos que os novos edifícios absorvem muitas famílias de alta renda”, declararam. Smith complementa que “moradias recentes a preços de mercado sobem. Os ricos mudam-se dos bairros pobres para as novas residências. E os aluguéis circundantes diminuem. Mais ou menos o oposto de gentrificação”, resume o economista.
Aquários yuppie: uma solução Yimby
Novas moradias a preço de mercado podem reduzir a gentrificação e o aluguel para famílias de baixa renda, mesmo em contextos em que a lei de oferta e procura não estiver em rigor, defende Smith. A teoria, descrita por ele pela primeira vez em 2018, recebeu o nome de Aquário Yuppie (Yuppie Fishtank Theory) e parte da realidade do Norte da Califórnia (EUA), onde se encontram as maiores empresas de tecnologia do mundo, instaladas na região de São Francisco. A ideia, conforme seu idealizador, é simples: construir mais “tanques” de vidro bonitos (torres envidraçadas e contemporâneas) para conquistar os yuppies assim que eles chegam à cidade.
O economista comenta no texto que a maioria dos yuppies (termo que abrange profissionais ligados ao setor de tecnologia, entre outros atraídos para a localidade) preferem viver nos aquários, uma vez que eles tendem a ser erguidos em regiões centrais, próximas dos lugares onde trabalham, com acesso facilitado a uma série de comodidades e lazer, do que em bairros residenciais mais antigos. Ele frisa também que é pouco provável que “residentes de longa data da classe trabalhadora, artistas em dificuldades e famílias de minorias desfavorecidas vivam em uma dessas torres que remetem a aquários de peixes”. Para ele, isso significa que cada unidade de alojamento desse tipo que for edificada – ou seja, novos imóveis a preço de mercado –, será ocupada por yuppies ou ficará vazia.
Ainda de acordo com a sua teoria, Smith assegura que os proprietários querem preencher todos as suas habitações, por isso, se houver aquários demais e eles ficarem fechados será necessário baixar o aluguel até que mais yuppies se mudem. Ele enfatiza que os “economistas reconhecerão isso como uma versão simples de um modelo de mercado segmentado”. O autor lembra que novas residências a preços de mercado estão “tirando yuppies da vizinhança das pessoas comuns e os colocando em aquários – e que isso é bom para todos”. Ele diz que essa solução não representa que a “construção de moradias nesse formato ou a permissão para elas sejam realizadas será suficiente para fornecer casas abundantes e acessíveis para a grande massa de americanos”. Significa apenas que isso não faz mal, ressalta Noah Smith.
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