Copenhagen

Cidades que optam pela preservação histórica e limitações ao aumento do adensamento urbano (Copenhagen) sofrem com o aumento do preço das moradias e a exclusão dos mais pobres

A capital da Dinamarca vive o dilema de como crescer e acomodar os novos moradores que chegam todos os anos sem perder as características que a transformaram em um exemplo europeu de localidade desenvolvida para as pessoas, de sustentabilidade, mobilidade e preservação histórica. Até 2031, Copenhagen deve contar com mais 100 mil habitantes, chegando a 725 mil residentes, conforme estimativa feita pela prefeitura em seu Plano Municipal de 2019, estudo que reúne metas a serem alcançadas até 2023 em diferentes setores, como moradia, transporte e geração de empregos. A elevação da demanda por casas e, consequentemente, dos preços das unidades para aluguel e compra é resultado desse incremento populacional contínuo e vem tornando a cidade um lugar muito caro para se viver.

Além da falta de propriedades – o levantamento do governo local indica a necessidade de construir 60 mil lares até 2031 para atender à atual e futura procura –, a capital possui uma legislação bastante complexa e restritiva para os contratos de locação e também para a edificação de empreendimentos e reforma de prédios e residências já existentes. Aliados, esses dois fatores dificultam a busca por habitações e acabam empurrando estudantes, famílias jovens e com menos recursos e idosos para o interior do país, como observou o doutor em Economia e professor da New York University em Shangai e da Copenhagen Business School, Rodrigo Zeidan, em seu perfil no Twitter.

A política de controle de aluguéis e a visão de manter o município com suas peculiaridades arquitetônicas que atraem turistas e cidadãos interessados em morar na capital são, na opinião de Zeidan, as principais responsáveis pelos elevados valores das unidades para locação em Copenhagen. “É quase impossível construir um prédio alto no Centro da cidade. Mesmo nos ‘subúrbios’, o governo não deixa aumentar a densidade”, afirmou ele em uma das postagens. O professor acrescentou ainda que as normas de zoneamento locais estão “entre as mais restritivas do mundo”, situação que leva a um desequilíbrio entre o número de propriedades disponíveis e de inquilinos. Com menos ofertas no mercado, ocorre uma “explosão” dos preços dos aluguéis.

As barreiras para encontrar uma residência têm também se estendido aos universitários, destacou Zeidan. Segundo ele, as vagas nas universidades de Copenhagen estão sendo diminuídas ao mesmo tempo em que estão sendo aumentadas em instituições de outros municípios dinamarqueses. O objetivo, analisou o professor, é reduzir a quantidade de pessoas que se mudam para a capital e melhorar o cenário de escassez de residências. A própria prefeitura admite o problema com as locações e conta com uma página oficial para dar dicas de como alugar um imóvel. O site traz ainda informações sobre os direitos e deveres dos inquilinos e um vídeo com relatos de estudantes e profissionais sobre as dificuldades que enfrentaram para conseguir um teto na cidade.

Devido às regras de controle de aluguéis, quanto mais tempo se fica em uma habitação, mais barato fica o valor da locação, explicou Zeidan, favorecendo aqueles que possuem contratos mais longos. “O limite de aumento do preço do aluguel é uma política criada nos anos 1930 para ser ‘temporária’. Está aí até hoje”, complementou. O professor argumentou também que esse contexto cria um “problema gigantesco” para a sustentabilidade de Copenhagen no longo prazo. Por fim, ele questiona se faz sentido manter uma região linda, “mas só para os ricos ou sortudos que têm contrato de aluguel com proteção”.

Pesquisas comparam custo da moradia subsidiada e privada no país

A Dinamarca possui uma política específica para a locação de imóveis, com uma legislação que divide as propriedades em duas categorias: privadas e subsidiadas pelas prefeituras. As residências desse último grupo têm 10% dos seus custos de construção pagos pelos governos locais que, em troca, possuem o direito de determinar para quem será destinada uma de cada quatro unidades oferecidas nas cidades, descreve matéria do The Local Denmark – site de notícias em inglês sobre a nação. Dessa forma, detalha a reportagem, o poder público pode fornecer habitação para os cidadãos que buscam um lar, dando às moradias uma função social.

Em geral, esses imóveis são geridos por uma associação e o valor da locação recebido é voltado para a conservação das residências e para pagar empréstimos dessas entidades, além disso os preços dos aluguéis são controlados. O The Local informa também que para viver em uma dessas casas subsidiadas é preciso se cadastrar em listas de espera organizadas pelas associações e aguardar a chamada. Em Copenhagen e Aarhus, segundo maior município da Dinamarca, pode levar anos para se chegar ao topo da fila, enquanto em lugares menores esse prazo pode ser reduzido para semanas ou mesmo dias.

O aluguel de uma moradia familiar subsidiada (aquela que não é reservada para estudantes ou idosos) é mais alto na região da capital do que nas demais áreas do país, custando cerca de 906 coroas dinamarquesas (em torno de R$ 769,74 em 13 de janeiro de 2022) o metro quadrado para um ano de locação, aponta relatório da Fundação Nacional de Construção de 2020 – instituição que apoia o setor de habitação social. Divulgado no final do ano passado, o estudo revela ainda que os valores mais baixos para esse tipo de unidade são encontrados no Sul do país, com um custo anual de 722 coroas (R$ 613,41) por metro quadrado. Os demais distritos analisados foram os de Zelândia, Jutlândia Central e Jutlândia do Norte, com preços médios de 859 coroas (R$ 729,81) por metro quadrado por ano, 778 coroas (R$ 660,99) e 747 coroas (R$ 634,65), respectivamente.

Na região metropolitana de Copenhagen, um apartamento subsidiado de 50 a 60 metros quadrados era alugado, em média, por 5.039 coroas ao mês (R$ 4.281) em 2020 e por 4.913 (R$ 4.174) coroas na Zelândia, exemplifica a matéria. Quando comparados com as residências privadas, os valores, que são regrados pelo mercado, são bem mais caros – o que se explica pela pequena quantidade de moradias disponíveis. Levantamento feito pelo centro de pesquisa habitacional Bolius em novembro de 2020 apurou que o custo de um apartamento privado de 56 metros quadrados em Nørrebro – bairro multicultural da capital e mais buscado por jovens e artistas – era de 8.536 coroas por mês (R$ 7.252), ressaltou a reportagem do The Local.

O estudo, que utilizou dados de 2019 e 2020 de plataformas de aluguel, avaliou os preços verificados em Nørrebro em relação a 16 outros distritos da Dinamarca. Quanto mais longe da capital, mais baratas ficam as locações privadas, inclusive para unidades maiores, concluiu a pesquisa. Em Kalundborg, na Costa Oeste da Zelândia, era possível achar um imóvel de 71 metros quadrados por 5.167 coroas mensais (R$ 4.389). Já na área de Jutlândia, na cidade de Esbjerg, havia propriedades de 54 metros quadrados por 4.399 coroas ao mês (R$ 3.737).

Ilha artificial é proposta para solucionar falta de residências

Entre as medidas para diminuir o desequilíbrio entre as moradias existentes e a demanda por elas e reduzir os valores cobrados nas locações em Copenhagen, o Plano Municipal de 2019 sugere a revisão da legislação de aluguéis – a última foi realizada em 2015 –, a diversificação no tamanho das habitações permitidas na capital, com possibilidade de construir casas menores e mais baratas, adequadas para estudantes, solteiros e idosos, e a edificação de novos prédios próximos a estações de transporte público. No entanto, a ação que vem chamando mais atenção é a ideia dos planejadores urbanos de criar uma ilha artificial na cidade, Lynetteholmen, perto da região central, assinala matéria da BBC.

No novo território serão instalados 35 mil imóveis com, pelo menos, 20% deles com aluguéis acessíveis para pessoas de baixa renda e universitários. Segundo a reportagem, a iniciativa auxiliará também a mitigar os efeitos do aumento do nível do mar decorrentes das mudanças climáticas e a evitar inundações no Centro. Com investimentos da prefeitura local e do governo dinamarquês estimados em 3 bilhões de dólares, as obras da ilha devem começar em 2035 e serem concluídas em 2070.

A arquiteta e professora de Desenvolvimento Urbano da Universidade de Copenhagen, Ellen Braae, disse à BBC que, apesar de estar “empolgada” com o projeto, acredita que ele pode trazer desafios de infraestrutura, assim como para garantir a diversidade dos moradores no bairro – impedindo que o destino se torne mais um lugar caro dentro do município. Essa não é a primeira vez que Copenhagen desenvolve uma ilha artificial para viver e trabalhar: um dos seus distritos mais conhecidos, Christianshavn, foi encomendado pelo rei Christian IV no século 17 e erguido sobre milhares de postes de madeira, recordou a matéria. Brygge, uma área portuária na região central, e grandes partes de Nordhavn, no Norte da cidade, também foram concebidos sobre o mar.

Conectar Lynetteholmen a outros pontos da capital por meio de ciclovias e de uma linha de metrô está nos planos das autoridades responsáveis pelo empreendimento, bem como avaliar outros modais, como barcos e carros autônomos. Existe ainda a previsão de edificar outras nove ilhas em um distrito industrial a cerca de 10 quilômetros ao Sul do Centro, formando um “Vale do Silício flutuante” como aponta a BBC. Nomeado de Holmene, o local reunirá empresas do setor de tecnologia e farmacêutico e poderá gerar em torno de 12 mil novos empregos. Com expectativa de iniciar a sua construção em 2025, até a publicação da reportagem havia poucas companhias inscritas para participar do projeto. 

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