Movimento Somos Cidade defende o desenho de espaços que coloquem os cidadãos como prioridade nos espaços públicos, tirando o foco dado aos carros desde a expansão da visão modernista no País.

Como retornar ao planejamento de localidades destinadas para os seus moradores e que promovam uma experiência urbana acolhedora e vibrante? A animação “Como voltar a construir cidades para as pessoas?”, desenvolvida pelo Movimento Somos Cidade, (www.somoscidade.com.br), demonstra como fazer isso e também explica os principais motivos que levaram os municípios nacionais a serem pensados priorizando a circulação de automóveis. “Com essa iniciativa, queremos conscientizar arquitetos e urbanistas, agentes políticos, mercado imobiliário e a sociedade em geral sobre a importância de projetar lugares focados na escala e experiência humana”, detalha o coordenador do movimento, o empresário Felipe Cavalcante, fundador e presidente de honra da Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (Adit).

O vídeo, com cerca de quatro minutos, lembra que muitos viajantes preferem conhecer destinos pelo mundo onde podem vivenciar as atrações a pé, indo de um lugar para o o outro apenas com uma curta caminhada ou utilizando o transporte público, aproveitando a oportunidade para tomar um café ou beber uma taça de vinho na rua ou fazer uma compra em algum estabelecimento comercial que fica pelo trajeto. Atividades essas que são comuns para os residentes e turistas de locais como Paris (França), Barcelona (Espanha), Nova York (Estados Unidos) e Veneza (Itália) – que são amigáveis aos pedestres – também poderiam ser rotineiras nas cidades brasileiras, se elas replicassem o desenho urbano desses lugares.

Vias com as mesmas dimensões e características da capital francesa, com calçadas largas, bancos, áreas verdes e lojas, padarias, cafeterias e restaurantes próximos uns dos outros, podem ser planejadas no Brasil, disponibilizando ambientes convidativos e vibrantes para as pessoas caminharem e permanecerem.

Mas, por que ruas bonitas e que tenham os indivíduos como o foco das decisões urbanísticas não são feitas por aqui? A animação esclarece que uma das razões para isso está relacionada à maneira como as legislações nacionais foram definidas, baseadas em conceitos do movimento modernista.

Entre os princípios difundidos por essa escola urbanística – Brasília é um dos seus ícones – tendo o arquiteto e urbanista suíço Le Corbusier como seu maior influenciador, estava a separação dos usos e funções dos municípios. Ou seja, habitação, comércio, trabalho, estudos e lazer ficavam em bairros distintos, impossibilitando que até mesmo as tarefas simples pudessem ser efetuadas a pé. Com esse tipo de projeto, o carro ganhou destaque como meio de locomoção e as localidades começaram a ser idealizadas para acomodar os veículos e permitir que eles circulassem com agilidade pelas vias.

Outro ponto negativo do modernismo ressaltado no vídeo é o modelo estabelecido nas normas urbanas de “torre no parque”, o que significa que os arranha-céus deveriam ser edificados no meio dos terrenos e cercados por espaços verdes. Apesar da intenção por trás da medida ser boa, melhorar a ventilação e a entrada de luz natural nos apartamentos, esse padrão acabou com as cidades para as pessoas. Com essa determinação, os prédios ficam longe das calçadas e das construções vizinhas, impedindo que se tenha fachadas ativas, que são as lojas, bares, restaurantes instalados no andar térreo e que deixam os ambientes mais agradáveis, vivos e seguros.

Reverter efeitos do modernismo passa por alterações nas leis e criação de espaços urbanos qualificados para os cidadãos

Conscientizar os integrantes das prefeituras e câmaras de vereadores é um dos desafios que se apresentam para voltar a planejar municípios bonitos e centrados nos indivíduos, salienta a animação do Somos Cidade. E isso só pode ser concretizado com o maior número de pessoas entendendo a relevância da adoção das melhores práticas urbanísticas para promover o bem-estar de todos e para se ter lugares mais diversos e acessíveis e cobrando do poder público as mudanças necessárias nas legislações.

Mas, diante do cenário que se revela hoje nas localidades brasileiras, o que seria preciso para transformá-las em destinos dinâmicos e confortáveis para os seus residentes? No entendimento do movimento Somos Cidade, o primeiro passo para isso é a elaboração de ambientes públicos que contem com senso de enclausuramento – que é a relação entre a largura da rua e altura dos edifícios. Essa proporção deve gerar um espaço agradável e aconchegante para os usuários, passando a sensação de proteção e refúgio.

Além disso, envolve o adensamento das áreas centrais dos municípios que possuem, geralmente, uma infraestrutura mais qualificada, o que deve ser feito de maneira amigável para os pedestres, e o investimento em transporte público. A mobilidade é, inclusive, mais um dos desafios a serem enfrentados nas próximas décadas, com o desenvolvimento e incentivo à utilização de diferentes modais, como, por exemplo, as bicicletas. Outros pontos acrescentados pela animação são a necessidade de acabar com a obrigação de recuos laterais e frontais dos prédios em zonas mais densas, aproximando-os das vias, e o fomento ao uso misto das construções.

Para tirar a prioridade dos carros nos lugares e devolvê-la às pessoas, é preciso ainda implementar mais ruas compartilhadas e calçadões, estimular as fachadas ativas e o comércio no térreo das edificações e ter uma preocupação maior com a interface entre o ambiente público e os andares baixos dos prédios do que com as suas alturas. “É viável melhorar as nossas cidades. A receita é conhecida e não é necessário que as prefeituras gastem um real com isso, mas que elas revejam as suas legislações sobre o desenvolvimento dos municípios”, argumenta Felipe Cavalcante.

Movimento Somos Cidade

O grupo, formado por pessoas apaixonadas por transformar as localidades e a vida dos seus moradores, surgiu em 2020 a partir da necessidade de alguns dos maiores desenvolvedores urbanos do País de terem um espaço para trocar experiências e debater as melhores práticas adotadas em empreendimentos e lugares que têm os indivíduos como prioridade e que buscam a criação de espaços dinâmicos e vibrantes. O retorno positivo da iniciativa levou os seus participantes a decidirem compartilhar sua visão e aprendizados com outros atores do planejamento urbano nacional e com a sociedade em geral – ampliando o conhecimento e a conscientização sobre a importância desse tema para todos.

Através do portal Somos Cidade, as principais questões relacionadas ao futuro dos municípios, desenho urbano, caminhos para a mobilidade, leis de uso do solo, densidade das construções e o que vem sendo feito de mais atual nessas áreas em outras regiões do mundo são abordados através de matérias próprias, do podcast do movimento e de uma curadoria de conteúdo focada nesse universo. Além de discutir esses assuntos, os integrantes do Somos Cidade saem do campo das ideias e aplicam as melhores técnicas urbanísticas em seus projetos.

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