idosos

Além do estilo de vida e dos aspectos socioeconômicos, a maneira como as localidades são planejadas impacta o bem-estar dos idosos, seu acesso aos espaços e a socialização. Qualificar calçadas e mobiliário urbano e aproximar atividades são formas de adequar os municípios às demandas desse público.

A quantidade de pessoas com 65 anos ou mais no mundo deve chegar a 1,6 bilhão em 2050, o dobro da registrada em 2021, conforme dados da Organização das Nações Unidas (ONU). A maior longevidade dos indivíduos e o crescimento da população em áreas urbanas são duas das principais transformações do século XXI e trazem novos desafios para as cidades. Com o aumento da expectativa de vida no planeta, que passará dos 73,6 anos em 2022 para 78,1 anos em 2050, como aponta artigo do Instituto de Métricas e Avaliação de Saúde da Universidade de Washington (EUA), as localidades terão que se preparar para facilitar o acesso, a interação social e a mobilidade desse grupo de residentes, assim como disponibilizar imóveis que possam ser adaptados para as distintas fases da vida.

A dieta seguida pelas pessoas, a frequência com que fazem exercícios e os fatores socioeconômicos que afetam a trajetória individual, como educação, apoio social, atendimento médico e status financeiro, são os critérios que mais chamam a atenção quando se avalia os elementos que influenciam o envelhecimento saudável. No entanto, eles não são os únicos a terem reflexos sobre a longevidade, as características urbanas e ambientais dos municípios também exercem um importante papel nesse sentido.

Pesquisa publicada na revista científica Nature, em 2021, investigou como as cidades podem passar de amigas dos idosos para lugares preparados para a longevidade. Segundo os autores do levantamento, não basta apenas adequar as localidades, é preciso que o seu planejamento seja feito desde o início pensando na promoção de um envelhecimento saudável ao longo de toda a vida e não focado somente na criação de ações e espaços pontuais para os mais velhos. Eles verificaram como os componentes presentes nas regiões, como os gases de efeito estufa, a poluição sonora e os extremos de temperatura, e o design urbano impactam a saúde – elevando os índices de doenças em idosos.

A idealização de áreas verdes nos municípios – como praças, parques e jardins – é um dos pontos ressaltados pelo estudo para deixar as cidades prontas para a longevidade, isso porque esses ambientes contribuem para que as pessoas pratiquem mais atividades físicas e tenham mais convívio social. Esses locais, quando bem projetados, podem ajudar a reduzir as temperaturas externas em dias quentes e absorver e filtrar alguns poluentes do ar, auxiliando diretamente no conforto térmico.

Ainda de acordo com a pesquisa, o planejamento de municípios preparados para o envelhecimento populacional deve incluir o desenho de comunidades caminháveis, repensar o transporte coletivo e os espaços públicos, revisar as normas de uso do solo e de construção, aprimorar os sistemas de distribuição de água das cidades, reformar prédios habitacionais e comerciais para deixá-los mais eficientes e acessíveis para diversas faixas etárias e atuar para diminuir os reflexos da crise climática. Os autores concluem que essa mudança de paradigma deve permear todas as etapas do design urbano, bem como questões sociais e os serviços das prefeituras.

Com a previsão de ter uma expectativa de vida acima da média global esperada para 2050, de 85,5 anos, a Espanha é um exemplo de país que conta com municípios benéficos para a velhice, destaca matéria do The Economist. Para a publicação, o Sul da Europa terá os cidadãos mais idosos do mundo. E os motivos para isso vão muito além da conhecida dieta mediterrânea (com grãos integrais, peixes, frutas, legumes, especiarias, azeite, entre outros ingredientes). Apesar de não estarem entre as nações mais ricas do continente, os espanhóis, italianos, franceses e portugueses vivem em lugares que incentivam uma rotina ativa e de maior conexão social.

As localidades da Espanha, salienta a reportagem, são densamente povoadas e compactas, com bairros que reúnem comércios, serviços e comodidades necessários para o dia a dia dispostos a distâncias que podem ser feitas a pé ou de bicicleta. O The Economist observa também que é comum ver nos municípios do país famílias multigeracionais, com integrantes com mais de 90 anos circulando pelas ruas com seus parentes. Por contar com cidades que são erguidas no entorno de praças, a nação estimula ainda os encontros com amigos e colegas nas áreas públicas, onde os indivíduos podem sentar, conversar, comer e beber. A socialização e a caminhabilidade são aspectos essenciais para a longevidade.

Entre as 30 localidades mais propícias para as caminhadas em 2024, conforme ranking elaborado pelo site de investimentos Insider Monkey e divulgado pela Forbes, as cinco primeiras posições foram ocupadas por municípios europeus: Florença (Itália), Riga (Letônia), Hamburgo (Alemanha), Porto (Portugal) e Madri (Espanha). Os fatores considerados no levantamento envolveram a distância entre as principais atrações dessas cidades, a qualidade das calçadas e do ar, facilidade de deslocamento, limpeza e manutenção dos ambientes e segurança. A lista traz também locais dos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Ásia, porém nenhuma da América Latina.

Características que deixam os espaços mais acessíveis para os idosos

Com a maior longevidade da população, os municípios precisam estabelecer estratégias para garantir que esse grupo crescente de pessoas tenha mais independência e segurança para se locomover pelas ruas, autonomia essa que permite uma maior inserção desse público na vida comunitária, econômica e familiar – reduzindo o isolamento e as suas consequências no bem-estar dos indivíduos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) trabalha com seus países-membros, dentro do contexto da Década das Nações Unidas para o Envelhecimento Saudável (2021 a 2030), o desenvolvimento de iniciativas nacionais e locais que levem à concepção de bairros amigáveis para os mais velhos. A entidade também apoia uma rede planetária de municípios que buscam esse mesmo objetivo.

Entre as medidas que podem ser adotadas, a OMS assinala a implementação de uma infraestrutura de transporte coletivo aperfeiçoada, acessos sem barreiras a edifícios e casas e assentos e banheiros públicos. O órgão possui ainda um manual, o Guia Global: Cidade Amiga do Idoso, que reúne os quesitos estudados em projetos para tornar os lugares mais qualificados e os itens que melhoram a experiência das pessoas nas localidades. Assim como o transporte, a entidade reforça a importância de pesquisar as moradias disponibilizadas, os indicadores de participação social, respeito e inclusão social, emprego, comunicação e informação, apoio comunitário e serviços de saúde e as áreas abertas e os prédios.

O material descreve também particularidades do cenário urbano e do ambiente construído vistas como relevantes por indivíduos mais velhos ouvidos nas consultas da OMS para a realização desse guia e ação. Os temas mais recorrentes que apareceram em diferentes cidades do mundo foram: qualidade de vida, acesso e segurança. Foram listadas ainda a influência positiva que espaços limpos, agradáveis e com proteção para os dias de chuva e muito calor têm na sua utilização por idosos, assim como as áreas verdes, e como a presença de bancos e de pontos para sentar é algo demandado por esse grupo etário. Muitas pessoas consultadas afirmaram que é difícil caminhar pelo seu bairro ou município se não houver algum lugar para descansar.

O deslocamento desses cidadãos também é impactado pela falta de cruzamentos seguros e de faixas para os pedestres e pela qualidade das calçadas. Passeios públicos estreitos, desnivelados, com buracos, meios-fios altos e obstáculos trazem mais riscos para os indivíduos com mais idade e pesam na decisão deles de andar a pé. Outro fator detalhado no manual são os edifícios amigáveis para os mais velhos. Entre os elementos que as construções devem ter para facilitar o acesso desse público estão elevadores, escadas rolantes, rampas, portas e corredores amplos, corrimão nas escadas, piso antiderrapante, ambientes de estar com sofá ou cadeiras confortáveis, sinalização adequada e banheiros públicos com acesso a pessoas com deficiência.

Enxergar esse grupo como consumidores e contar com bons serviços de atendimento aos clientes, prontos para suas demandas, é outra característica relatada no guia que ajuda uma região ser adequada para a longevidade. A instalação de comércios, restaurantes, cafés e outros atrativos próximos uns dos outros e de onde esses indivíduos vivem e com fácil acesso, como ficarem no térreo dos prédios, colaboram para que eles sejam mais frequentados pelo público com mais idade.

No Brasil, 32 localidades são certificadas pela OMS como Amigas da Pessoa Idosa, ou seja, que se comprometeram a tornar os seus serviços e estruturas físicas mais inclusivos e receptivos às necessidades desse grupo. A Rede Global de Cidades e Comunidades Amigas das Pessoas Idosas, que tem cerca de 1,5 mil membros e em torno de 830 municípios das Américas do Sul e do Norte, conta com a participação das seguintes localidades nacionais: Itabirinha (MG), Bom Sucesso do Sul (PR), Chopinzinho (PR), Dois Vizinhos (PR), Itapejara d’Oeste (PR), Nova Esperança do Sudoeste (PR), Pato Branco (PR), Pérola do Oeste (PR), Realeza (PR), Renascença (PR), Santa Tereza do Oeste (PR), Santo Antônio do Sudoeste (PR), Sulina (PR), Planalto (PR), Salgado Filho (PR), Barracão (PR), Capanema (PR), Capitão Leônidas Marques (PR), Cascavel (PR), Colombo (PR), Curitiba (PR), Enéas Marques (PR), Irati (PR), Prudentópolis (PR), Vitorino (PR), Esteio (RS), Pelotas (RS), Porto Alegre (RS), Veranópolis (RS), Balneário Camboriú (SC), São José do Rio Preto (SP), Jaguariúna (SP).

Residências pensadas para acompanhar o envelhecimento dos indivíduos

A habitação é um componente fundamental, segundo a Organização Mundial da Saúde, para adequar as cidades para responder às demandas da população mais velha. Erguer novas moradias ou melhorar as existentes é uma das necessidades enfatizadas pela arquiteta e chefe de pesquisa em habitação do escritório inglês Levitt Bernstein, Julia Park, em entrevista para o jornal The Guardian. Ela frisa que a maioria das casas não foram criadas tendo em mente a longevidade de seus moradores.

Para Julia, com a modificação na forma de idealizar as unidades, repensando o tamanho dos imóveis e a existência de escadas com muitos degraus, e aprimorando o sistema de transporte coletivo, é possível que mais idosos permaneçam em suas residências e se envolvam com atividades de seus bairros, amigos e familiares, diminuindo o sentimento de solidão e isolamento. Junto ao desejo de se manterem conectados aos outros e à comunidade ao seu redor, o público com mais idade atualmente é muito mais interessado em design e, uma boa parcela dele, em tecnologia.

A arquiteta, que é coautora do livro “Age-Friendly Housing: Future Design for Older People (Habitação Amigável aos Idosos: Projeto Futuro para Pessoas mais Velhas)”, pondera ainda que os apartamentos são uma boa alternativa para esse grupo etário. Ela cita como exemplo de empreendimento concebido com o foco nos idosos um complexo no bairro Ǿrestad, em Copenhagen (Dinamarca), que é subsidiado pelo governo municipal. O prédio é colorido e possui espaços sociais flexíveis e café, salão de beleza e consultório odontológico no térreo – negócios que são abertos ao público em geral, permitindo uma interação entre moradores e visitantes. Internamente, as entradas das unidades são personalizadas para que os residentes possam identificá-las mais facilmente.

Como a maioria dos indivíduos não se mudará na velhice, é essencial adaptar o estoque de imóveis. Isso pode ser realizado aperfeiçoando a eficiência energética e incorporando recursos tecnológicos às casas, como o controle remoto da iluminação e do aquecimento, banheiros inteligentes que auxiliam na higienização e independência dos indivíduos e câmeras instaladas no teto que podem detectar alterações nos padrões de caminhada dos idosos.

Promover a aproximação de gerações por meio do homeshare ou cohousing, como explica a reportagem do The Guardian, é outra opção que vem ganhando adeptos em lugares como a Alemanha e Espanha para contribuir com o envelhecimento saudável. Eles programas funcionam da seguinte forma: pessoas mais velhas com um cômodo vazio em suas moradias trocam o aluguel da peça por companhia de jovens e por cerca de dez horas semanais de tarefas a serem combinadas. A iniciativa oportuniza que os idosos sigam em suas habitações e indivíduos mais novos consigam viver em bairros com infraestrutura mais qualificada e centralizados.

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