
Idealizar locais que proporcionem senso de comunidade e experiências qualificadas é um grande desafio para desenvolvedores imobiliários, especialmente para quem busca estabelecer um novo destino nas cidades. Com o placemaking, diferentes ações podem ser realizadas nesse sentido e para ter empreendimentos que entreguem mais valor.
Uma praça bem-cuidada e com diversas opções de atividades, uma rua com calçada larga, mobiliário, serviços e comércios ou um trajeto seguro de ciclovia. São muitos os elementos que fazem com que um espaço seja frequentado, apreciado e defendido pelos seus usuários. Por trás da concepção de lugares que despertem esses sentimentos há uma série de estratégias e conceitos que auxiliam no desenvolvimento de ambientes significativos, que gerem pertencimento e uma vida urbana mais vibrante e ativa – como o placemaking.
Com definições que variam conforme o seu autor, o placemaking pode ser compreendido como uma abordagem para criar locais que as pessoas realmente gostem, se conectem e onde elas queiram morar, trabalhar, brincar e aprender, resume o coordenador do Somos Cidade, empresário e fundador e presidente de honra da Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (ADIT Brasil), Felipe Cavalcante. “O placemaking possui duas dimensões. A primeira é intangível e emocional, envolve fazer ativações e provocar sentimentos. Seria o software de um projeto. A outra é física, o hardware, que trata do desenho urbano, arquitetura, paisagismo, mobiliário, iluminação, entre outros fatores”, descreve.
O termo placemaking (que pode ser traduzido como fazer lugares) foi disseminado com mais intensidade no final da década de 1990 por meio do Project for Public Spaces (PPS), uma organização sem fins lucrativos dos Estados Unidos fundada em 1975. No entanto, a visão de que os municípios deveriam ter espaços mais dinâmicos e atrativos e com os indivíduos no centro das decisões surge com o escritor e jornalista William H. Whyte, mentor do PPS devido ao seu estudo pioneiro sobre o comportamento humano nas áreas urbanas. Ideias que foram abraçadas por outros pensadores, como a escritora Jane Jacobs, e arquitetos e urbanistas, como Jan Gehl.
Iniciativas em distintas escalas podem adotar o placemaking, da idealização de uma praça a um bairro inteiro. Porém, salienta Cavalcante, existem diferenças quando essa ferramenta multidisciplinar é usada em complexos imobiliários. “Enquanto no placemaking tradicional a comunidade já existe, você escuta as pessoas e as empodera para que assumam a liderança do projeto, no imobiliário, principalmente quando se fala em lançamento de um produto, não há ainda clientes, é preciso criar a comunidade e os laços entre os indivíduos e deles com o local”, detalha.
Outro ponto assinalado por ele é que no placemaking tradicional não existe um ‘dono’ da comunidade, já no imobiliário esse papel é desempenhado pelo empreendedor, que toma a frente para ativar aquele novo destino, promove eventos e aproxima os futuros habitantes dessa região. A conexão entre as pessoas e o complexo faz com que os clientes virem fãs, aumentando a propaganda boca a boca e tornando a comunidade mais vibrante, frisa Cavalcante.
Além de construir ambientes melhores, com charme, identidade e seguros, o placemaking é uma estratégia de um produto mais inteligente, acrescenta a gerente de Produto da BairrU, Yasmin de Nadai. “Hoje, até mesmo a compra tradicional de um lote, de uma casa, está se transformando em uma experiência. Os clientes não adquirem mais só metragem, planta e localização, eles querem qualidade de vida, serviços acessíveis, oportunidades de convivência e uma rotina mais leve. E o placemaking entra como um diferencial competitivo”, observa.
Segundo ela, bairros que investem em espaços públicos qualificados e na vida comunitária mais ativa têm um valor percebido pelas pessoas muito maior. “Elas veem um lugar onde querem estar e não apenas um bem adquirido”, pondera. O placemaking traz também resultado comercial, acelerando o desejo de compra, proporcionando engajamento emocional e senso de pertencimento mesmo antes desses indivíduos se mudarem, complementa Yasmin. “Vivenciamos isso no estande de vendas do Parc Autódromo (em Pinhais, PR). De tão efetivo que foi o nosso storytelling, as pessoas viram ali não só um lote de um bairro planejado, mas um estilo de vida”, compartilha.
A valorização do empreendimento foi destacada também pelo sócio-fundador da Unique Construtora, Fellipe Arruda. Ele conta que para o lançamento do primeiro projeto da empresa, o Alameda Unique, a companhia adotou o equipamento urbano em frente ao seu terreno e ali instalou uma praça – antes de iniciar as obras do prédio. A medida foi uma maneira de ativar a área, que fica em um vetor de crescimento de Caruaru (PE), e trazer o público-alvo do desenvolvimento para aquele novo endereço.
“Quando estávamos pela metade da estrutura do edifício, já tinha ele 100% vendido”, comemora. Apesar de não conhecer até então o termo placemaking, a Unique implementou diversas ações alinhadas a esse conceito, que impactaram positivamente o bairro, a cidade e o sucesso do Alameda Unique. Arruda recorda que o preço das unidades teve um incremento relevante do início das vendas até a comercialização dos últimos imóveis.
Distintas iniciativas de placemaking para cada fase dos empreendimentos
“Placemaking é um trabalho de formiguinha, precisa ter uma narrativa de longo prazo, começando na concepção do projeto e indo até a ocupação. E a cada etapa desse processo é uma abordagem diferente que a gente usa”, relata a gerente de Produto da BairrU, Yasmin de Nadai. Ela comenta ainda que na fase de idealização, de desenho urbano e arquitetura é necessário pensar em como o design do lugar favorece a utilização espontânea dos ambientes e cria conexões entre os indivíduos.
Nesse momento, são analisadas questões como onde devem ficar as fachadas ativas, o fluxo natural de caminhabilidade, como as calçadas vão funcionar diante de alguns usos e qual o melhor local do terreno para colocar o principal espaço de encontro. “Isso para mim já é uma escolha de placemaking”, argumenta. Ela brinca que essa estratégia é a arte de projetar para as pessoas serem turistas todos os dias na região e no município onde residem, com curiosidade e utilizando as suas áreas.
Durante o pré-lançamento de um empreendimento, muitas vezes é preciso pôr o lugar onde ele será concretizado no mapa ou reposicionar a percepção de valor desse local e levar os indivíduos para conhecê-lo, agrega o coordenador do Somos Cidade, Felipe Cavalcante. “A grande vantagem do placemaking nessa etapa e no pós-lançamento é atrair pessoas qualificadas de um determinado nicho ou padrão para visitar o estande de vendas”, afirma. Em vez de anunciar o produto na televisão, são concebidas atividades para tornar aquele destino desejável e frequentado e gerar muitos leads.
É na fase de pós-lançamento que também começam a ser feitos eventos para formar uma comunidade entre quem já virou cliente do complexo e a comunicação com esses futuros moradores para que na hora de entregar o empreendimento isso seja feito da melhor forma possível, aponta Cavalcante. De acordo com Yasmin, no lançamento e na ativação inicial do desenvolvimento, o placemaking ganha uma dimensão mais sensorial e social, quando a narrativa do local passa a ser vivida de verdade.
“O cuidado aqui é que as ativações reflitam os valores da iniciativa. Evento por evento não faz sentido, é preciso idealizar experiências que reforcem esse novo lugar”, exemplifica. Yasmin revela que no Parc Autódromo, a empresa primeiro entendeu quais eram os pontos fortes da região, como o polo de cervejas artesanais, para então firmar parcerias para trazer eles para dentro do complexo e efetuar ações em conjunto. “Essas medidas mostram na prática o tipo de vida urbana que estamos propondo para aquele bairro.”
Já na pré-entrega da obra e ocupação ocorre a formação da comunidade em si, enfatiza Cavalcante. “Com os primeiros clientes se mudando para o espaço, quanto mais bem-feito foi o trabalho nas etapas anteriores, mais rápida vai ser a apropriação dos ambientes”, diz Yasmin. Ela pontua que as parcerias comerciais são essenciais nesse processo para trazer um movimento de indivíduos diversos, para a permanência naquela área ser mais longa e para oferecer pontos de descanso e gastronomia.
Conforme a gerente de Produto, essa é a hora em que a associação de moradores tem que brilhar, fortalecendo o senso de comunidade através de iniciativas de cuidado com o bairro e de convivência entre vizinhos. “Precisa ter muita escuta ativa para entender as necessidades das pessoas que começaram a viver ali”, salienta. No primeiro projeto da empresa, o Bairru das Cerejeiras, em Guarapuava (PR), a associação está operando há cerca de cinco anos e, mesmo tendo ainda um caminho de amadurecimento da gestão comunitária, já possui um sentimento de pertencimento forte, indica Yasmin, inclusive eles conseguiram alterar o nome do bairro para que ele carregasse o mesmo do empreendimento. “Isso é placemaking da maneira mais potente possível”, reforça.
O trabalho no Bairru das Cerejeiras tem servido de aprendizado para errar menos quando chegar essa fase no Parc Autódromo, explica Yasmin. Com aproximadamente 30% dos 1,4 mil lotes residenciais ocupados no Cerejeiras, ela destaca que tem ficado mais claro que a velocidade de transição da comunidade do desenvolvedor para a associação de moradores está ligada diretamente à ocupação, maior frequência de indivíduos no lugar e o senso de coletividade – algo que leva tempo para ser construído. A companhia mantém um comitê de clientes ativo com o qual se reúne com frequência para ouvir suas demandas e prepará-los para o papel que vão assumir mais à frente.
Essa transição, analisa Cavalcante, começa depois da entrega da obra, mas alguns projetos de longo prazo vão fazendo isso aos poucos. “Se a empresa tem um land bank valioso e que vai durar 20, 30 anos, ela precisa de alguma maneira ir passando o bastão para a comunidade, fortalecendo-a, mas ao mesmo tempo ainda ter algum tipo de atuação”, acrescenta.
Pilares para atrair os públicos-alvo e criar espaços mais dinâmicos
Gastronomia, esportes, ambientes para as crianças, áreas urbanas de qualidade e eventos de vários portes são os cinco pilares que mais atraem as pessoas para um determinado destino, segundo o coordenador do Somos Cidade, Felipe Cavalcante. “No placemaking, além de darem vida ao local, eles conseguem levar indivíduos que vivem a 15, 20, 30 minutos ou mais longe até aquele ponto do município e torná-lo desejado”, ressalta.
Para conceber lugares com os quais os seus frequentadores se identificam, a BairrU combina em seus desenvolvimentos conceitos de bom urbanismo, Cidade para Pessoas e desenho urbano que incentiva as conexões e um bom mix de usos comerciais, assim como tenta entender os usos simbólicos e as potências da região. “E também projetar com intenção cada espaço, pensando na vivência dos indivíduos, e oferecer segurança”, relata a gerente de Produto da empresa, Yasmin de Nadai.
O sócio-fundador da Unique, Fellipe Arruda, agrega que o placemaking e o investimento no urbano e nas pessoas para disponibilizar lugares melhores têm um poder que não se consegue dimensionar. “A idealização da praça em frente ao Alameda Unique deixou uma grande lição, que é a cada novo desenvolvimento não pensar só no produto, mas nos indivíduos, na ativação, na cidade e que o impacto que o empreendimento vai ter no entorno seja positivo”, assinala.
A maioria das companhias do mercado imobiliário não fazem placemaking ou gestão de comunidade, não possuem cultura de relacionamento com os clientes, reflete Cavalcante. “Muitas empresas precisam primeiro verificar se estão fazendo o básico nessa área: se é fácil se comunicar com elas, a qualidade da obra, por exemplo, e enquanto houver insatisfação é necessário arrumar a cozinha de casa primeiro”, afirma. Depois disso, essas companhias devem começar a pensar o relacionamento com os clientes de uma forma mais ampla e, então, a questão da comunidade e do placemaking.
Box de Experiências reforça conceito do bairro Parc Autódromo
Os 560 mil metros quadrados do antigo autódromo de Pinhais, na região Metropolitana de Curitiba, estão sendo transformados em um novo endereço. Com projeto do arquiteto e urbanista Jaime Lerner, o Parc Autódromo une prédios e lotes residenciais e edifícios comerciais a um extenso ambiente verde e de lazer. Entre as estratégias de placemaking para ativar o local está o Box de Experiências, um espaço temporário do complexo, descreve a gerente de Produto da BairrU, Yasmin de Nadai.
Para criar um senso de lugar antes dele começar a ser construído, a empresa fez o retrofit da antiga estrutura dos boxes e instalou uma via modelo bem ambientada, playground para as crianças, espaços dinâmicos e vem realizando uma série de eventos para que as pessoas gostem de ficar naquele local e compreendam o conceito do bairro planejado de bem-estar, vida ao ar livre e mobilidade ativa. “Dessa forma, elas já conseguem ver o cuidado que o empreendedor tem com a área e visualizar um pouco do que está se prometendo entregar”, reforça Yasmin.
Ela assinala ainda que o investimento em placemaking traz resultados desde indicadores comerciais até percepções mais emocionais do público. A empresa notou que o Box de Experiências encurtou o ciclo de decisão sobre a compra do produto. “A ideia de entregar mais que infraestrutura, entregar um estilo de vida aumentou muito o valor percebido do empreendimento, tanto que lançamos ele com valor muito acima do mercado”, enfatiza. Para Yasmin, o placemaking gera uma cidade que aproxima os indivíduos. Porém, ela frisa que essa abordagem só funciona de verdade se ela tem uma estrutura de governança e de manutenção dos ambientes.
Outra ação que está em andamento no Parc é o diálogo com as comunidades mais vulneráveis do entorno do autódromo. “Estamos promovendo encontros e iniciativas sociais para não erguer ali mais uma barreira. A gente quer integrar o bairro nesse tecido urbano de forma respeitosa e inclusiva, com todo mundo entendendo que o espaço é aberto para todos – seja para morar, trabalhar, consumir ou se divertir”, informa.
Praça cria novo destino e potencializa lançamento do Alameda Unique
Antes de lançar o seu primeiro projeto, em Caruaru (PE), que fica a cerca de duas horas da capital Recife, a Unique Construtora entregou ao município uma nova área de lazer e de encontros. Instalada no lote em frente ao terreno onde está sendo edificado o Alameda Unique, a praça passou a atrair pessoas para essa região em expansão da cidade e possibilitou que elas conhecessem o lugar e o empreendimento, que é composto por duas torres residenciais e um mix de 13 lojas que ficará no térreo.
O espaço público, que tem aproximadamente 2 mil metros quadrados, foi a solução encontrada pela companhia para se tornar mais conhecida em Caruaru. “Somo uma empresa relativamente jovem, completamos seis anos em 2025. Apesar de já termos know-how para desenvolver empreendimentos, pois nossa equipe já trabalhou em outras empresas, éramos desconhecidos na localidade e tínhamos pouca credibilidade”, lembra o sócio-fundador da Unique, Fellipe Arruda.
A praça será mantida pela companhia por dez anos, de acordo com o que determina a legislação municipal. Um dos desafios para a concretização do ambiente coletivo, revela Arruda, foi definir quais seriam os equipamentos presentes nele para que os públicos-alvo do projeto passassem a frequentar essa área, como famílias com crianças, idosos e pessoas com pet. O sócio-fundador da Unique ressalta que eles tiveram a ajuda do arquiteto do complexo, Juliano Dubeux, para alcançar esse resultado. A construtora fez também a urbanização do entorno do Alameda Unique. “A gente realmente criou um novo endereço para a Caruaru, porque ali era um grande vazio urbano”, detalha.
Ele conta que no momento de entrega do equipamento comunitário, começaram a planejar como ativá-lo. “Foi quando, aos poucos, a gente passou a entender o que era placemaking. Na verdade, só um ano depois do espaço estar em funcionamento é que entramos em contato com o conceito, durante o Complan (Seminário sobre Comunidades Planejadas e Loteamentos da ADIT Brasil), em Florianópolis (SC), em 2022.” Mesmo sem conhecer ainda o placemaking, tema que foi estudar depois do Complan e da missão técnica que fez com a ADIT Brasil para a Holanda e Áustria, em 2023, Arruda realizou diversos eventos para movimentar a praça e o novo destino e elevar a permanência dos frequentadores na área.
Muitas das atividades – como desfiles de moda, feiras e eventos fitness e culturais – foram efetuadas em parceria com negócios locais. “Colocamos também foodtrucks, cafeteria, brinquedos infláveis, um restaurante junto à sede da Unique, que foi implementada em dos nossos terrenos na região, concebemos um calendário de ações e um perfil no Instagram para divulgar as iniciativas”, comenta. O ambiente coletivo, complementa Arruda, acabou sendo chamado pelos usuários de Praça da Unique e se transformou em uma nova centralidade do bairro. “Depois dela, outros equipamentos começaram a ser instalados no entorno”, comemora.
O sócio-fundador da Unique frisa que a praça foi criada para ajudar a vender o produto e para que a população passasse a vê-los como uma empresa com credibilidade, mas acabou se tornando uma experiência que trouxe muitas lições sobre o que um empreendimento pode fazer para trazer melhorias para a cidade. “Agora, quando a gente vê um terreno para um novo projeto já digo: o que posso fazer a mais do que só o prédio aqui dentro desse lote”, salienta. Os próximos passos, adianta Arruda, envolvem qualificar mais a urbanização das regiões próximas à praça, melhorar os usos e as conexões entre os complexos, gerando uma grande comunidade.
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