Por Felipe Cavalcante, Fundador do Movimento Somos Cidade
São Paulo dá um passo curto, mas necessário, correto e na direção certa
No dia 16/12/24, o Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo) finalmente retirou do tombamento a exclusividade de construção de residências unifamiliares e autorizou a construção de condomínios horizontais na região dos Jardins Europa, América, Paulista e Paulistano em São Paulo.
A decisão ainda precisará ser ratificada pela Secretaria de Cultura. Além disso, para a efetiva construção de empreendimentos multifamiliares na região ainda será necessária uma atualização do zoneamento municipal, que atualmente estabelece a região como Zona Exclusivamente Residencial (ZER).
Apesar dessas etapas ainda a serem cumpridas, a decisão é um primeiro passo fundamental para acabar com uma das maiores aberrações urbanas do mundo, a manutenção de bairros de mansões no coração da área mais urbanizada, adensada, atrativa e com melhor oferta de trabalho e serviços de São Paulo, entre a Avenida Paulista e a Avenida Faria Lima.
A realidade e o “Espírito do tempo” estão, aos poucos, se impondo.
De um lado, a sociedade mudou e com ela o tamanho das famílias, cada vez menores.
Do outro lado, a praticidade do mundo moderno e a participação ativa das mulheres na economia, tornam a vida em mansões restrita a ainda menos famílias.
O custo de manutenção de mansões é outro fator importante no aumento da quantidade de casas desocupadas, tanto nos Jardins, quanto em bairros com restrições similares, como Morumbi e Pacaembú.
Mas se alguns proprietários de imóveis ainda lutam contra a mudança, é grande a quantidade de donos de mansões que já perceberam o enorme prejuízo que estão tendo ao possuir imóveis com alto custo de manutenção, com pouco mercado para revenda e que possuem uma fração do potencial construtivo dos bairros ao redor.
Apesar de uma decisão correta, foram estabelecidas três limitações que restringiram a oferta de moradia: altura máxima de 10 metros, proibição de subsolos com mais de 1,5m de profundidade, e o impedimento de aberturas de ruas dentro dos lotes.
A despeito do impacto na oferta de moradias ser limitado devido a essas três restrições, a medida tem uma relevância muito importante por acabar com uma visão elitista e prejudicial à cidade que vigorava há 100 anos, desde que a Companhia City as impôs em seus empreendimentos e depois as validou na legislação urbanística da cidade.
A quantidade de novos imóveis que será construída na região não deve ser tão grande e ainda deve continuar a atender os muitos ricos. Porém, mesmo assim é um avanço, pois veremos o fenômeno da Filtragem em ação.
Onde antes havia uma moradia, vai haver quatro ou seis agora. Essas quatro ou seis famílias desocuparão os imóveis anteriores, que serão ocupados por outras pessoas em um efeito cascata que atinge até a periferia e os imóveis de mais baixa renda. Assim, a Filtragem trará as pessoas para morar mais próximas da região central.
Esse adensamento urbano é um dos maiores consensos atuais no mundo do planejamento urbano. O adensamento é uma das principais armas contra o aquecimento global e reduz a pressão sobre a ocupação das áreas naturais e de agricultura no entorno das cidades.
Ele também aumenta a qualidade de vida das pessoas, que reduzem seus deslocamentos. Também é o adensamento que viabiliza o transporte público e a mobilidade ativa.
É também ele, junto com o uso misto, que torna as ruas e espaços públicos mais vibrantes e seguros.
A decisão do Condephaat vai no caminho certo, apesar da timidez, pois reforça que o que deve ser preservado é o espaço público único dos bairros-jardim e não as casas construídas dentro dos lotes.
A cidade de São Paulo ganha muito com essa decisão, mesmo quem acha que não está sendo impactado por essa decisão.
As únicas pessoas que são contra essa medida são os muito privilegiados que ainda conseguem manter suas mansões. São os interesses delas contra os interesses da cidade. Parece que esse será um dos raros casos em que a cidade vai sair ganhando contra um grupo de pessoas tão poderosas. Já não era sem tempo. É preciso acabar com o egoísmo urbano em São Paulo.
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