
Com o rápido crescimento populacional e as transformações tecnológicas, climáticas e socioeconômicas, novas abordagens para o desenvolvimento dos municípios são necessárias para ter espaços mais flexíveis, qualificados e sustentáveis.
AAté 2041, a população do Brasil deve chegar a 220,4 milhões de habitantes, um aumento de cerca de 4,2% em relação a 2023, conforme projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já a Organização das Nações Unidas (ONU) calcula que o mundo contará com 9,9 bilhões de pessoas nos próximos 29 anos. Diante dessa perspectiva, das alterações cada vez mais aceleradas da sociedade, economia e tecnologia e do agravamento da crise climática, o planejamento urbano precisa ser repensado, incluindo a avaliação de novos elementos e o uso de ferramentas inovadoras, e mais dinâmico para responder a essas – e futuras – modificações.
Nesse cenário, aponta artigo da plataforma Urban Design Lab, o planejamento está evoluindo de uma estrutura rígida para uma prática mais flexível, que se adapta às contínuas mudanças das forças do mercado. O papel dos profissionais que atuam nessa área também passa por transformações e desafios, como o de atender às demandas dos atuais e novos moradores das cidades – oferecendo infraestrutura, moradia e mobilidade qualificadas – e equilibrar as iniciativas de interesse público com as do setor privado, fomentando ambientes urbanos melhores, mais resilientes e sustentáveis.
Segundo a publicação, esses objetivos exigem uma compreensão mais aprofundada das condições locais e globais – como contextos histórico e geográfico, visões políticas, situação socioeconômica e movimentos migratórios, por exemplo –, levando os planejadores a reformularem estratégias tradicionais para projetar as cidades. Para o Urban Design Lab, os países em desenvolvimento têm um caminho ainda mais complexo pela frente, pois precisam solucionar também problemas relacionados à disponibilidade de serviços essenciais, de habitação informal e de vulnerabilidades sociais e ambientais.
A ONU estima que hoje mais de 1 bilhão de indivíduos no planeta vivam em favelas, com limitações de acesso ao transporte, saúde, educação e lazer, de acordo com o Relatório dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável de 2023. No Brasil, o Censo de 2022 verificou que havia 12.348 favelas e comunidades urbanas, onde residiam mais de 16 milhões de pessoas – 8,1% da população do País. Sem medidas para reverter esse panorama e aprimorar o planejamento e os espaços urbanos – o documento da ONU indica ainda que três em cada quatro municípios do mundo possuem menos de 20% do seu território destinados a áreas públicas e ruas – a tendência é que as localidades continuem seu movimento de espraiamento e acrescentem mais 2 bilhões de moradores em assentamentos informais até 2050.
Revisão das leis que orientam o crescimento das cidades, incentivo para o desenvolvimento imobiliário junto aos sistemas de transporte coletivo e decisões baseadas em dados são ações que podem contribuir para a eficácia das estratégias urbanas. Um estudo do Banco Mundial, destacado pelo Urban Design Lab, revela que os municípios que usam análise de informações podem ter melhorias de eficiência do planejamento urbano de até 30%. Nesse sentido, a tecnologia é uma aliada fundamental para apurar dados em tempo real que permitirão aos profissionais e gestores anteciparem com mais acerto as alterações do mercado e as necessidades de recursos.
Coletar informações sobre os padrões de deslocamento, fluxo do trânsito, tendências populacionais, habitações e serviços públicos fornecem insights relevantes sobre a dinâmica urbana e auxiliam os processos de planejamento a serem mais responsivos e adaptáveis, enfatiza o Urban Design Lab. Pesquisa da consultoria McKinsey demonstrou que localidades que adotam ferramentas tecnológicas para a administração da sua infraestrutura aprimoram indicadores-chaves de qualidade de vida de 10% a 30%, o que pode representar mais segurança para os indivíduos, viagens diárias mais curtas e redução das emissões de gases de efeito estufa.
Inteligência Artificial (IA), Internet das Coisas (IoT), dados de geolocalização e outras inovações estão tornando as cidades mais capacitadas também para a gestão dos serviços e para o futuro. Com o potencial de processar e avaliar grandes quantidades de informações, a IA e o Big Data têm colaborado para que as regiões urbanas fiquem mais resilientes, inclusivas e sustentáveis. Essas modificações do planejamento urbano devem envolver ainda as comunidades, reforça o Urban Design Lab, para que seja possível identificar as suas demandas e aspirações. Essa iniciativa eleva a participação das pessoas e a legitimidade das decisões.
Um exemplo dado pela organização é o de Portland (EUA), que implementou soluções de planejamento inclusivo com retorno positivo e índices mais altos de satisfação dos residentes. Trazer perspectivas diferentes para as ações urbanas ajuda os profissionais desse segmento a idealizarem lugares que reflitam de maneira concreta a identidade, as vontades e necessidades dos integrantes de uma comunidade.
Projetando cidades mais resilientes e prósperas
Conectados à realidade do seu tempo, mas com os olhos para o futuro, os planejamentos urbanos não podem ser elaborados sem levar em conta também os contextos histórico e geográfico para que sejam eficientes, alerta o Urban Design Lab. Conforme a organização, a compreensão dessas tendências possibilita que os profissionais concebam medidas que irão estar em sintonia com as demandas contemporâneas. Um caso estudado pela Urban Design Lab é o do surgimento do Novo Urbanismo, nos anos 1990, como uma resposta às dificuldades causadas pela expansão suburbana.
Defendendo a criação de comunidades caminháveis e empreendimentos mistos, o movimento nascia como um contraponto ao desenvolvimento centrado nos carros e na separação de funções – morar, trabalhar e se divertir. Além de resolver questões de mobilidade, poluição do ar e acesso a oportunidades, o planejamento urbano atualmente precisa enfrentar o aumento da frequência e gravidade dos desastres ambientais. É nesse cenário que a resiliência se transforma em mais um fator significativo para o crescimento dos municípios.
Em 2024, segundo o instituto de pesquisa WRI, foram registrados 58 eventos climáticos extremos no planeta, como inundações, secas e queimadas, como as que ocorreram em distintos estados do Brasil. Um levantamento efetuado pela entidade averiguou que o investimento de um dólar em adaptação das localidades (melhorias em sistemas de alerta precoce e infraestrutura mais preparada para essas situações, por exemplo) pode gerar mais de 10,50 dólares em benefícios ao longo de uma década. Esse valor reflete tanto as perdas evitadas com os desastres como as vantagens econômicas, sociais e ao meio ambiente produzidas mesmo quando esses eventos não acontecem.
A resiliência é a capacidade das cidades sobreviverem, se adequarem e prosperarem diante de choques e tensões, planejando riscos futuros e garantindo que o ambiente construído esteja pronto para lidar com eles nos próximos 10, 20 ou 50 anos, define artigo do Fórum Econômico Mundial. A resiliência não abrange somente a questão climática, ela envolve o desenvolvimento dos municípios. O Urban Design Lab acrescenta que localidades que investem em infraestrutura qualificada e economia diversificada estão mais adaptadas para prosperar em meio às incertezas.
Nova York (EUA), cita a organização, se comprometeu a aportar 19,5 bilhões de dólares em projetos de resiliência climática até 2026. O plano inclui o fortalecimento de defesas costeiras, modernização dos sistemas de transporte público e valorização dos espaços verdes. O foco nessas áreas, detalha o Urban Design Lab, tem como meta proteger as comunidades mais vulneráveis da cidade, uma vez que muitas delas estão instaladas em zonas mais propensas a inundações. Ao mesmo tempo, a prefeitura pretende gerar empregos e impulsionar as economias locais.
Alguns municípios já estão colocando em prática iniciativas para mitigar os efeitos do aquecimento global e das mudanças climáticas, pintando telhados de branco para refletir o calor, implementando coberutas verdes e incrementando as regiões sombreadas, exemplifica o Fórum Econômico Mundial. Phoenix (Arizona), que fica no deserto e é apontada como a cidade mais quente dos Estados Unidos, está usando “pavimento frio” em suas vias, um revestimento de cor clara que resfria as ruas mais rápido à noite do que o asfalto tradicional.
Uma das estratégias ressaltadas para diminuir as inundações das localidades é o aperfeiçoamento da absorção da água da chuva através da redução da impermeabilização dos solos e do combate à expansão urbana desorganizada. O Fórum Econômico Mundial assinala ainda que alterar fábricas, escritórios e shopping center para residências auxilia na adequação ágil do parque habitacional existente para atender ao aumento populacional. No entanto, um dos empecilhos para tirar essas soluções do papel, relata a instituição, é a falta de financiamento.
Municípios inovam para serem sustentáveis
Mitigar as emissões de gases de efeito estufa e descarbonizar suas economias são objetivos estabelecidos por muitas cidades pelo globo. Muitos desses lugares já implementaram em seus planejamentos urbanos ações para diminuir a utilização de veículos e estimular o uso de outros meios de locomoção, melhorando o seu transporte coletivo e elevando o espaço nas vias para as bicicletas e os pedestres. Amsterdam (Holanda), com seus mais de 500 quilômetros de ciclovias, e Copenhagen (Dinamarca), com em torno de 370 quilômetros, são referências mundiais em mobilidade ativa e em outras medidas verdes.
As políticas ambientais da capital holandesa buscam reduzir as emissões de CO2 em 55% até 2030 e em 95% até 2050. As metas climáticas da localidade visam também a eliminação de todos os tipos de deslocamento que produzem emissões e a geração de 80% de toda a eletricidade das moradias por meio de energia solar e eólica nos próximos cinco anos, adianta a revista Green Building & Design (gb&d). Por sua vez, Copenhagen quer se tornar neutra em carbono ainda neste ano e para isso aumentou as suas áreas verdes – mais de um quarto do município é ocupado por lugares com vegetação –, determinou a obrigatoriedade de novas edificações terem telhados verdes e alcançou o índice de mais de 50% da energia da cidade ser proveniente de fontes renováveis, especialmente a eólica, solar e de sistemas de biomassa.
Porém, algumas localidades estão apostando em iniciativas sustentáveis em outras direções: para os subsolos. Crescer para o subterrâneo tem sido a alternativa encontrada por vários municípios para enfrentar as crises climáticas e contar com um desenvolvimento equitativo, descreve artigo do The City Fix. Mais do que espaços para a construção de sistemas de transporte, essas áreas oferecem abrigo contra tempestades e isolamento natural, diminuindo a demanda de energia para aquecimento e resfriamento. De acordo com a publicação, ao transferir serviços públicos e funções industriais para o subsolo, as cidades ganham mais terrenos para praças, residências populares, parques e projetos voltados aos pedestres.
Helsinque (Finlândia) é um dos exemplos apresentados pelo The City Fix no urbanismo subterrâneo. A localidade possui um plano diretor para o subsolo que engloba shopping center, data center e um complexo de piscinas, aliviando as pressões sobre a utilização do solo. Em Montreal (Canadá), estufas aproveitam a energia geotérmica para o cultivo de produtos frescos o ano todo, mitigando os impactos das condições climáticas extremas nas safras. Por sua vez, Paris (França) planeja otimizar a sua infraestrutura urbana para agregar túneis para pedestres, fazendo a conexão entre os principais centros de transporte coletivo e exposições de arte.
A tecnologia é uma peça-chave para a disseminação do uso do subsolo e a implementação de novas soluções para tornar os municípios mais resilientes e sustentáveis. Em Hong Kong, as formações rochosas receberam reservatórios e estações de tratamento de resíduos, já Tóquio (Japão) construiu reservatórios subterrâneos para evitar inundações durante a temporada de tufões. Com informações, flexibilidade e inovação, profissionais e gestores podem garantir que o planejamento urbano não seja apenas uma medida reativa e sim uma estratégia dinâmica para idealizar cidades melhores para as próximas gerações, projeta o Urban Design Lab.
Seja o primeiro a receber as próximas novidades!
Não fazemos SPAM. Você pode solicitar a remoção do seu email a qualquer tempo.