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O design das vias públicas afeta, além da proteção, a maneira como as pessoas se deslocam, a sustentabilidade e ainda a vitalidade dos negócios locais. Novo estudo conclui que pistas mais largas aumentam os riscos de acidentes no trânsito e que uma redistribuição das áreas urbanas, tirando o foco dos veículos, traz diversos benefícios.

Quem já precisou mudar de trajeto para não ter que passar por uma rua com movimento intenso de carros, onde era difícil de atravessar ou não havia calçadas ou sinalização adequadas, sabe o quão importante é planejar os espaços para que eles sejam seguros para todos os indivíduos. Apesar de muitas cidades continuarem a desenhar as vias públicas centradas para permitir a locomoção rápida dos automóveis de um ponto a outro, construindo faixas amplas e retas, um número crescente de municípios está alterando essa abordagem e diminuindo a largura das pistas e a velocidade em algumas de suas regiões.

Levantamento desenvolvido no ano passado por pesquisadores da Escola de Saúde Pública Bloomberg da Universidade Johns Hopkins (EUA) descobriu que ruas com faixas de 3 metros a 3,6 metros, onde os veículos podem circular de 48 quilômetros por hora a cerca de 56 quilômetros por hora, possuem chances significativamente maiores de registrar acidentes em comparação com pistas de em torno de 2,7 metros de largura. Os autores apontam que estreitar as faixas melhora a proteção de todos os usuários que utilizam as vias. Eles ponderam também que essa medida possibilita que mais ciclovias e passeios públicos sejam implementados, acomodando uma quantidade maior de pessoas em menos território.

A redução do impacto ambiental – através do menor uso de pavimento asfáltico, com menos consumo de terras e mais superfícies permeáveis – é outra vantagem de modificar o design das ruas ressaltada pelo estudo. O estreitamento das pistas pode ainda impulsionar a atividade econômica das localidades, elevando o valor das propriedades e fomentando as operações comerciais instaladas ao longo do trecho transformado. Ao todo, os pesquisadores analisaram 1.117 vias de distintas cidades dos Estados Unidos, como detalha matéria da Forbes.

Eles utilizaram dados quantitativos e qualitativos de políticas de transporte, buscando informações junto à associação daquela nação que define os padrões técnicos nacionais para os projetos de rodovias e investigando os desafios, soluções e legislações de cinco estados – Flórida, Califórnia, Vermont, Delaware e Oregon – sobre a largura das faixas na segurança do trânsito. A esses elementos apurados, os autores acrescentaram dados referentes às características específicas de ruas urbanas classificadas como “arteriais” ou “coletoras”, que são aquelas mais propensas a serem usadas por pedestres e ciclistas, de Dallas (Texas), Nova York (NY), Filadélfia (Pensilvânia), Salt Lake City (Utah), Miami (Flórida), Denver (Colorado) e Washington (DC).

Com todas essas informações, eles estabeleceram 18 variáveis, como número de pistas e sua largura, presença e extensão de calçadas, ciclovias e estacionamento para carros nas vias e a quantidade de paradas de ônibus, que foram empregadas para avaliar a relação entre a largura das faixas e a ocorrência de acidentes em cada seção das ruas abrangidas pelo estudo, entre 2017 e 2019, indica a reportagem da Forbes. Os pesquisadores afirmaram também, conforme a publicação, que estreitar as pistas é, entre as diferentes alternativas possíveis, a maneira mais barata e econômica dos municípios adicionarem mais áreas à infraestrutura de transporte já existente para os indivíduos caminharem e pedalarem.

Eles calcularam ainda que as ações de reaproveitamento das faixas podem ter custos que variam de 5 mil a 30 mil dólares por cada 1,6 quilômetro (1 milha). Enquanto isso, o valor necessário para a implementação de uma nova estrada arterial urbana de duas pistas com uma ciclovia de em torno de 1,2 metro gira em 6 milhões de dólares por milha. Um aspecto reforçado pelos autores é a relevância do contexto ao redor das vias, uma vez que nem todas podem ser apropriadas para uma diminuição das suas faixas e remodelagem para comportar outros meios de deslocamento.

O exemplo dado pelos realizadores do levantamento é que uma rua que funciona como um corredor de tráfego ou de cargas, provavelmente, demandaria pistas mais largas que 2,7 metros. No entanto, aquelas com limites de velocidade de 32 quilômetros por hora a 56 quilômetros por hora, que possuem um volume de trânsito menor, têm estacionamento mínimo na via, são relativamente retas e contam com uma quantidade pequena de faixas são consideradas ótimas candidatas para um estreitamento.

Velocidade: outro elemento-chave para se ter ruas seguras

A redução da velocidade em vias de determinados bairros é outro fator essencial a ser avaliado nas estratégias dos governos locais para aumentar a proteção das pessoas nos espaços públicos. O risco de morte para pedestre com automóveis circulando a 50 quilômetros por hora é o dobro do verificado em acidentes que ocorrem com veículos a 40 quilômetros por hora e mais de cinco vezes maior que o perigo quando eles estão a 30 quilômetros por hora, segundo a Forbes.

A segurança no trânsito é um problema mundial, como salienta a Organização das Nações Unidas (ONU). Todos os anos, em média, 1,3 milhão de cidadãos perdem a vida no tráfego no planeta, informa a entidade, sendo a maior causa de falecimentos de indivíduos com idade entre os 5 e os 29 anos. Somente no Brasil, foram 33.894 óbitos no trânsito em 2022, de acordo com dados do Observatório Nacional de Segurança Viária, uma elevação de 0,24% em comparação com 2021. A região Norte do País foi a que apresentou o maior percentual de mortes, com um incremento de 7,6%, e a Sudeste foi a única que teve uma queda na quantidade de falecimentos no tráfego no período, com -3,73%. Os números confirmam a urgência dos municípios repensarem o desenho de suas ruas e de tornar os lugares mais convidativos e protegidos para que os seus usuários possam escolher opções de locomoção ativas, como caminhar e pedalar.

A idealização de vias seguras é, para a Iniciativa Global Designing Cities (projeto independente da Rockefeller Philanthropy Advisors), uma responsabilidade compartilhada por designers, engenheiros, tomadores de decisões e reguladores. O programa frisa que propostas de ruas semelhantes a rodovias, que priorizam os carros em vez de pedestres e ciclistas e incentivam altas velocidades, não conseguem disponibilizar ambientes seguros às pessoas. Em seu guia de planejamento de vias públicas, traz uma relação de condições que tornam as ruas mais perigosas.

Entre as causas para os acidentes e mortes no tráfego, conforme a Iniciativa Global Designing Cities, estão a falta de calçadas ou a presença de passeios estreitos ou com bloqueios, como buracos, e a inexistência de travessias acessíveis e de estrutura para quem pedala. Outros aspectos citados são a ausência de proteção (vias largas, com várias faixas e sem refúgio, que expõem os indivíduos aos automóveis em movimento por distâncias maiores enquanto atravessam as ruas), falta de previsibilidade (quando semáforos ou relógios de contagem regressiva não foram instalados), áreas de desembarque/embarque inseguras para os passageiros e a carência de cruzamentos eficientes.

Ainda segundo o projeto, a maioria das agendas de segurança viária está concentrada na probabilidade de erro humano e utiliza a educação e a fiscalização do trânsito para tentar diminuir as situações de risco, sem dar ênfase na importância do desenvolvimento das vias para aumentar a proteção dos indivíduos. Para a iniciativa, o design pode garantir que um acidente ou conflito causado por imperícia dos usuários ou motoristas seja limitado em sua gravidade. Diversos programas estão sendo lançados no mundo com o foco na concepção de ruas seguras.

O Vision Zero, iniciado na Suécia, na década de 1990, e o Sustainable Safety, que começou na Holanda, na mesma época, são exemplos de abordagens centradas no desenho das vias que vêm sendo implementadas por distintas nações. Ambos têm como meta a queda das mortes no tráfego e, para isso, estimulam a criação de ruas que reduzam a velocidade, a fiscalização rigorosa contra violações de trânsito e campanhas de conscientização para quem utiliza esses espaços urbanos.

Diferentes medidas elevam a proteção das pessoas nas vias públicas

Mais do que pontos de passagem, as ruas deveriam ser vistas como lugares profundamente humanos, assinala artigo do Projetc for Public Spaces (PPS). São nesses ambientes coletivos que ficam as lojas, o trabalho, as moradias e o lazer e a diversão, locais com os quais os indivíduos interagem diariamente. Por isso, deixar as vias mais seguras, tornando-as mais atrativas para todos os usuários, é um dos desafios que as administrações públicas precisam enfrentar, revendo suas políticas de transporte e investindo em design para reformular as regiões.

O instituto de pesquisa WRI Brasil destaca seis formas de transformar as ruas em áreas mais protegidas para todos. A instalação de uma rede de calçadas contínua e acessível, que traga conforto para aqueles que a usam, é a primeira dica dada pela entidade. De acordo com a organização, passeios públicos bem elaborados não terminam abruptamente no meio da quadra ou nos cruzamentos e disponibilizam espaços para que as pessoas caminhem, descansem, socializem, façam compras ou comam algo em um café, bar ou restaurante.

Descreve ainda que a calçada deve ser planejada com três seções: uma faixa de transição para portas, mobiliário e outros elementos dos estabelecimentos, uma livre para facilitar a circulação e uma de serviço, em que podem ser colocadas árvores, placas de sinalização, lixeiras e mobiliário urbano. Para que esse passeio possa ser acessado por indivíduos de todas as idades e com capacidade de mobilidade variadas, ele deve ter também rampas, pavimento antiderrapante para diminuir o risco de quedas e superfícies táteis para os pedestres com deficiência visual.

A conversão de lugares inativos ou subutilizados em ambientes de permanência é mais uma maneira sugerida para aumentar a segurança das vias. Com baixo custo, utilizando tinta, vasos de plantas, recursos paisagísticos, iluminação, bancos e intervenções artísticas, é possível idealizar novos pontos de convivência nos bairros. A cidade de Nova York, exemplifica o WRI Brasil, verificou uma queda de 16% nas altas velocidades e de 26% nos acidentes de trânsito nas ruas com praças. Além disso, essas regiões revitalizadas contribuem para os negócios do entorno e fortalecem a interação da comunidade.

O instituto de pesquisa relata ainda que é necessário desenvolver zonas seguras para crianças e adolescentes, áreas que devem ter boas condições para caminhar e andar de bicicleta, assim como espaços específicos para os veículos que estão buscando ou deixam os jovens, seja na escola, em parques, playgrounds, clubes ou em centros comunitários. Sinalização e faixas de pedestres visíveis, calçadas largas e a implementação de infraestrutura de moderação de tráfego para reduzir a velocidade dos carros nessas zonas são outros mecanismos para ajudar os usuários a fazerem seus percursos.

A concepção de ambientes viários compartilhados é outra recomendação da entidade. Esse tipo de solução, em que as vias são abertas para os automóveis, ciclistas e pedestres, funciona em regiões de alta densidade e com baixo volume de trânsito. Esse modelo de rua não conta com meio-fio vertical, diferença de nível, marcações de calçada ou cores que delimitam os lugares para os diversos meios de deslocamento. A prioridade nas vias compartilhadas é dada àqueles que caminham e as trocas sociais, culturais e econômicas são fomentadas. Por todos usarem a mesma área, há uma cautela maior na locomoção, com uma tendência dos veículos circularem com velocidades mais baixas.

O WRI Brasil reforça ainda que o desenho de ruas exclusivas para os pedestres é uma forma eficiente de garantir mais segurança para as pessoas, assim como colabora para diminuir a poluição e os ruídos, refletindo positivamente na saúde dos indivíduos, valoriza os imóveis e potencializa as vendas dos estabelecimentos presentes naquele espaço. A organização enfatiza que essas vias devem ser instaladas estrategicamente em lugares fáceis de serem acessados a partir das regiões residenciais e comerciais e precisam estar bem conectadas ao sistema de transporte público, ciclovias e estacionamentos.

Por fim, o instituto de pesquisa observa que promover dias sem carro, com vagas para automóveis transformadas em parklets ou em ambientes de jogos para as crianças e para apresentações culturais, ajudam as pessoas a explorarem seus bairros e municípios a pé ou de bicicleta, se apropriando das áreas urbanas de um outro jeito e elevando a sensação de pertencimento. Isso auxilia também, conforme a entidade, a mudar a perspectiva que os cidadãos têm sobre a rua e os espaços públicos.

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